
20/09/07
Nem só
de pão vivem alguns homens
De
Baku - Azerbaijão
Semana passada apresentei um
pouco da culinária daqui. Hoje apresento o contrário:
o Ramadã, o mês de jejum do povo mulçumano.
Nas ruas eles se cumprimentam assim: “Ramadã
Kareem!” e “Ramadã Mubarak!”. É
um sinal de que estão vivendo o nono mês do
calendário islâmico. Para celebrar o Ramadã,
milhares de mulçumanos participaram da primeira oração
do mês de jejum, na última sexta-feira (14/09),
dentre eles acredita-se que os azeris também. Já
ouviu falar do Ramadã??
Ramadã é nono
mês do calendário islâmico, mês
de jejum, piedade e recolhimento mulçumano. A palavra
Ramadã encontra-se relacionada com a palavra árabe
ramida, “ser ardente”, possivelmente pelo fato
do Islã ter celebrado este jejum pela primeira vez
no período mais quente do ano. Uma vez que o calendário
islâmico é lunar, o Ramadã não
é celebrado todos os anos na mesma data, podendo
passar por todas as estações do ano.
É mês sagrado, período de renovação
da fé, da prática mais intensa da caridade,
e vivência profunda da fraternidade e dos valores
da vida familiar. Neste período pede-se ao mulçumano
maior proximidade dos valores sagrados, leitura mais assídua
do Alcorão, freqüência à mesquita,
correção pessoal e autodomínio. Além
das cinco orações diárias (salat),
durante este mês sagrado recita-se uma oração
especial chamada Taraweeh (oração noturna).
O jejum é observado
durante todo o mês, do alvorecer ao pôr-do-sol.
O jejum aplica-se também ao fumo e às relações
sexuais. O mulçumano deve não só abster-se
destas coisas, mas também não pensar nelas.
É o único mês mencionado pelo nome no
Alcorão:
"O mês do Ramadã
foi o mês em que foi revelado o Alcorão, orientação
para a humanidade e evidência de orientação
e discernimento." (Alcorão Sagrado 2:185)
O jejum é obrigatório
a todos os muçulmanos que chegam à puberdade
e que goze de plena saude fisica e mental. A primeira vez
em que um jovem é autorizado a jejuar pelos pais
constitui um momento importante na sua vida e uma marca
simbólica de entrada na vida adulta.
Há várias justificativas
válidas para não jejuar: gravidez, amamentacao,
menstruação, resguardo pós parto, enfermidade,
trabalho braçal extenuante e estar em viagem. O idoso
que seja fisicamente incapaz de jejuar, para este o jejum
não é mais obrigatório. No caso de
uma doença incurável a pessoa deixa de jejuar
definitivamente. Cabendo a ambos, caso possua condições,
dar, para cada dia não jejuado, uma refeição
a um necessitado, ou o valor equivalente a esta refeição.
Caso contrário, estará perdoado em não
fazê-lo. Os dias de jejum não praticado, pelos
demais casos, devem ser cumpridos em outra ocasião,
antes do próximo Ramadã.
Como existe a opção
de se jejuar ou dar de comer a um necessitado, observo que
no Azerbaijão entre os jovens, pelo menos, poucos
fazem praticam o jejum. Sua maioria é de jogadores
de futebol, nao sei se devido a profissão, podem
se abster devido aos treinos diários, ou se estão
dando de comer a algum necessitado, porque o que mais vemos
são eles comendo e muito bem.
Meu esposo presenciou, no Ramadã anterior, um amigo
de trabalho que dizia estar fazendo o jejum, mas que as
escondidas comia demais.
Todas as práticas durante o jejum sao baseadas no
Alcorão, antes do início de cada jejum diário
é’ feito o Suhur, uma pequena refeição
que substitui o café da manhã (pequeno-almoço)
habitual. Seria uma refeição da madrugada,
para aliviar a fome e a sede e assim iniciar o próximo
dia de jejum.
Disse o profeta Muhammad:
"Lançai mão do Suhur, porque há
benção nesse ato."
Por outro lado, o profeta os
orienta a quebrar o jejum logo após o pôr-do-sol,
sem prorrogá-lo, que seria o Iftar, que ao término
de cada dia, o jejum é finalizado com uma oração
e uma refeição especial tomada em comum, chamada
iftar. Primeiramente o jejum é quebrado com água
e tâmara, depois vem a refeição. É
momento para reunir os membros da família e os amigos
numa celebração de fé e de alegria.
Atualmente, com a ampliação
do diálogo interreligioso, algumas pessoas de outras
religiões são convidadas a partilhar este
momento de convívio e é cada vez mais freqüente
que cristãos ofereçam e celebrem um iftar
para os seus amigos muçulmanos.
"Assim disse Ala: Dentre
os meus servos, prefiro aquele que se apressa em quebrar
o jejum.".
Quanto a quebrarmos o jejum
com água e tâmara, ele disse:
"Quando alguém quebra o jejum, deve fazê-lo
com uma tâmara. Se não tiver, deverá
fazê-lo com água, porque é pura, e purifica
todo o organismo."
Se analisarmos esta recomendação
do ponto de vista médico, veremos que os intestinos
absorvem a água adoçada em menos de 5 minutos,
proporcionando, assim, ao organismo, a recuperação
imediata das calorias perdidas durante jejum, ao passo que
se enchermos o estômago com água e outros alimentos,
o organismo necessitaria de três a quatro horas para
processar essa mesma operação.
A anulação do
jejum se dará caso a pessoa pratique deliberadamente
um desses atos, sabendo que o mesmo é pecado: comer,
beber, fumar, ou ter relação sexual.
A expiação para
este ato será que a pessoa faça um jejum durante
60 dias seguidos para cada dia não jejuado, ou que
dê de comer a 60 pessoas pobres. Mesmo que se faça
tal expiação, terá perdido muitas graças,
como disse o profeta Muhammad :
"Quem quebrar um dia de
jejum em Ramadan sem desculpa ou enfermidade, não
o substitui o jejuar o resto de sua vida, mesmo que o faça."
O sentido desde dito é
que jejuar um dia no mês de Ramadan é mais
valioso, perante Ala, do que jejuar a vida toda. Agora,
caso a pessoa estando de jejum se esqueça e coma
ou beba, ao se lembrar deverá imediatamente parar
a ingestão do alimento ou da bebida e prosseguir
o jejum, pois este ainda estará valendo.
Disse o profeta Muhammad (que
a Paz e a Bênção de Deus estejam sobre
ele):
"Quando algum de vós come ou bebe, por acidente,
esquecendo-se do seu jejum, deve continuar o jejum até
o fim, porque (comendo ou bebendo por engano) significa
que Ala lhe deu de comer e de beber."
O sublime espírito do
Jejum no mês de Ramadan:
Engana-se quem pensa que o jejum é apenas deixar
de comer, beber, fumar ou ter relações sexuais.
A privação não é a finalidade
desta adoração e sim os inúmeros benefícios
que estão por detrás deste ato.
Apesar de o jejum parecer difícil, ele não
é imposto como uma forma de punição,
mas sim como um ato de devoção e auto disciplina.
Logo, para eles o jejum é
uma extraordinária escola que ensina os mais altos
graus de moralidade, cria o amor e a misericórdia
nos corações e acostuma com a prática
da caridade.
O jejuador procura dizer coisas
construtivas para os outros e nunca procura causar distúrbios
entre as pessoas, procura dizer sempre a verdade e ser leal,
não mentir nem difamar os outros, procura cumprir
as suas promessas e nunca agir hipocritamente.
Portanto, justificam que ao
jejuar um mês todo ano e colocar em prática
tais ações, eles verão como isso é
viável e procurarão agir dessa forma o ano
inteiro.
Logo, tem-se no jejum um verdadeiro
exercício da fé. O ato de ficar com fome e
com sede não é, em si, adoração,
mas um meio para realizar a verdadeira adoração.
A verdadeira adoração
para eles significa desistir de violar a Lei de Ala, por
temor e amor a Ele, buscando realizar atividades que O agradem,
e refreando quanto às que não O agradam, caso
contrário, estarao apenas causando uma inconveniência
desnecessária ao estômago.
Além de ser uma revisão,
um balanço de suas vidas, eles devem perguntar se
estao agindo de acordo com o que agrada a Alá ou
não?
Existe ainda durante este periodo, dois dos mais importantes
feriados religiosos, dias mais importantes: Laylat al Kadr
e ‘Id al Fitr.
Laylat al Kadr ("noite
do destino"; "noite do poder"; "noite
da determinação"; "noite do decreto
divino") é celebrado na noite do dia 26 para
o 27 do Ramadã, data em que se comemora a noite em
que Profeta Muhammad recebeu a primeira revelação
do Alcorão. Muitos muçulmanos passam esta
noite a rezar, acreditando que os pedidos feitos durante
estas horas serão atendidos por Deus.
‘Id al Fitr - Eid ul-Fitr
- ("o banquete do término do jejum"), no
encerramento do mês do Ramadã, no primeiro
dia do mês de Shawwal, é um feriado celebrado
durante três dias. Banquetes são servidos,
presentes são trocados, roupas novas são vestidas.
Amigos e familiares rezam em congregação e
fazem banquetes. Em muitas cidades islâmicas grandes
festividades são realizadas para celebrar o ‘Id
al Fitr. Os turcos chamam esta festa de Sheker Bairam (festa
do açúcar). Está prescrito nesta festa
a prática da Zakat al fitr, doação
de esmolas da quebra do jejum.
Em sua aparência exterior
esta celebração islâmica assemelha-se
ao Natal cristão. Percebo que aqui no Azerbaijão
a prática do Ramadã é muito discreta,
sem leis rigidas como no Irã, Iraque, entre outros,
onde muitos restaurantes são fechados durante o periodo
de jejum e os bares e casas noturnas também. Os que
insistem em permanecer abertos podem receber a punição
das famosas chibatadas. No Azerbaijão, 90% da população
é mulçumana, mas nem todos estão dentro
desta prática como os radicais xiitas, nem mesmo
os mais liberais sumitas.
Mais uma curiosidade e tradição
deste mundo pseudo-mulçumano.
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Aline
Orlando Ramim, é paulista, casada, brasileira,
e nao desiste disto. Sonhadora, vive atualmente em Baku,
logo ali no Azerbaijão, na região da antiga
União Soviética onde está conhecendo
e vivendo coisas que jamais imaginaria. Aline é curiosa
ao extremo, mas não é egoísta, por
isso compartilha suas curiosidades todas as quintas-feiras
aqui.
Fale com ela: alineorlando@hotmail.com
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