E para Matuner, inclusive, a
próxima geração é quem fará
do Brasil o país do futuro. Será
Jorge? “O Brasil é um gigante que se fingiu
de invisível até agora! Mário de
Andrade, Raul Bopp, Oswaldo de Andrade, Plínio
Salgado já diziam: nós somos a cultura mais
original do mundo.
Crédito: Rafael
Pedroso
04/10/07 O profeta otimista
brasileiro: Jorge Mautner Por onde quer que pisem seus pés, o multi Jorge
Mautner gosta de divagar sobre “o futuro do mundo
pertence ao Brasil”, além dos contos, causos
e suas músicas inteligentes
De Bauru - São Paulo
Mautner
no dia do show durante a tarde, num bate- papo com interessados
organizado pelo SESC Bauru. Crédito:
Gabriel Ruiz
Recentemente Caetano Veloso, em entrevista à rede
Globo exaltou a principal característica do povo
brasileiro: o seu poder de miscigenação, a
absorção de culturas e a capacidade de bater
tudo isso no liquidificador. Contudo, é ainda outro
tropicalista que teoriza melhor sobre o assunto: Jorge Mautner.
O carioca que já viveu 66 verões é
de tudo um pouco na área das artes: escritor, músico,
compositor, cineasta, e, sobretudo, um contador de estórias
e causos. Até por isso, pela época em que
viveu e as coisas que construiu, carrega em sua biografia
situações interessantíssimas. Uma delas,
já faz tempo. Passou-se no colégio Dante Alighieri
em São Paulo. O pré-adolescente Mautner foi
expulso da escola. Foi considerado um “pervertido”,
quando escreveu um texto classificado pelos professores
como “tarado”. Mas o mundo dá voltas
e hoje no colégio há uma homenagem ao artista:
uma sala toda dedicada a ele. E nessas voltas que o mundo
dá, Jorge foi parar no EUA, como exilado político,
após ver seu nome incluído na Lei de Segurança
Nacional (LSN). Em Nova Iorque se virou como pôde:
laçou pratos, traduziu livros e realizou palestras
sobre as traduções, pra gringo ver. Ganhou
notoriedade por lá e nas Américas. Já
no ano seguinte parte para a Venezuela a fim de participar
de um Seminário Internacional em Caracas.
O
menino Mautner: muita literatura, de Fausto a Guimarães
Rosa. Crédito:
reprodução/trajetória do Kaos/ Azougue
Editora
Novos tempos Mas os tempos são outros,
como o próprio carismático Mautner diz. Tempo
em que as crianças não precisam de professores
para aprender a lidar com computadores. “Numa escola
colocaram professores para ensinar os alunos a usarem computadores.
Mas foi justamente na ausência desses professores
que eles mais aprenderam. Deixaram os alunos sozinhos na
frente dos computadores; resultado: 90 % deles aprenderam
sem ninguém ensinar, não é fantástico?”
– indaga ele com um baita sorrisão.
E para Matuner, inclusive, a próxima geração
é quem fará do Brasil o país do futuro.
Será Jorge? “O Brasil é um gigante que
se fingiu de invisível até agora! Mário
de Andrade, Raul Bopp, Oswaldo de Andrade, Plínio
Salgado já diziam: nós somos a cultura mais
original do mundo. Justamente porque conseguimos captar
um pouco de cada uma e fazer um mix disso”. Em São
Paulo, por exemplo, na praça da Sé –
Jorge conta - figura de vez em quando por lá, um
combo de “samurai” com “candomblé”.
Difícil imaginar? É mais ou menos isso que
Mautner anda irradiando por aí.
Outro otimismo irradiante de
Mautner é: “nós somos a alegria do mundo”.
Mas provavelmente a gente não saiba, ou não
queira acreditar. Como exemplo, o artista cita a visita
de um alemão e um ucraniano ao Brasil, a fim de levar
aos seus países de origem, o que aprenderam com a
nossa gente. O alemão questionou-o: “lá
a gente tem verba sobrando, pra investir, tem escola pra
todas as crianças, tem tudo, mas ainda assim, eles
não são felizes. Aqui, tem menino andando
de bicicleta com roupa rasgada e assobiando ainda por cima,
como é possível?”.
“O mundo todo está copiando essa capacidade
nossa de resolver conflitos, resolver numa boa, é
o que o mundo mais precisa”, completa o autor de “Maracatu
Atômico”.
Segredo Jorge
nos contou que participou de reuniões junto a CBF
e a FIFA acerca de um plano para a Copa do Mundo de Futebol
de 2014, que será realizada no Brasil. “Em
todas as partidas da seleção brasileira, durante
os seis anos que precedem a Copa do Mundo, a delegação
será acompanhada por um grupo de artistas brasileiros
para irradiar através da música, da arte,
do cinema, da literatura, das artes plásticas, essa
cultura para o mundo todo”. E profetiza: “a
operação é planetária agora,
aproveitando até o futebol!”.
Realmente é bem difícil crer nesse otimismo
todo, sobretudo por conhecermos tantos problemas estruturais
e sociais do país, sem falar das péssimas
condutas políticas de nossos “representantes”.
Entretanto, para Mautner, isso não é relevante.
“Essa coisa nossa que estou falando aqui, transcende.
Isso vai sacudir qualquer desatento, independentemente de
questões políticas”.
Ao lado de Nelson Jacobina, no palco do SESC. Crédito:
Rafael Pedroso
No palco Na
apresentação realizada na noite de quarta
(19-09), em Bauru – SP, Mautner mantém quase
o tempo todo um violino à sua mão esquerda.
Ao lado dele, Nelson Jacobina na guitarra e violão
climatizava as trovas, causos e poesias. O foco principal
eram músicas do último disco, “Revirão”.
Mas no meio de uma música e outra surge um sucesso
(“Morre-se assim”, “Vampiro”, “Locomotiva”,
por exemplo), ou outra estória curiosa. “Numa
aula de matemática, estava lendo um livro, pois já
havia aprendido aquela lição com meu pai.
A professora não gostou e enviou uma carta notificando
e reclamando da minha postura na sala. Então expliquei
para o meu pai que ele já tinha me ensinado a lição
e que eu estava, portanto, lendo outra coisa. Agi errado
pai? Ele respondeu: você não estava nem certo,
nem errado, mas acostume-se, porque sempre falarão
que você agiu de maneira errada”.
O
violino só sai das mãos de Mautner, para dar
lugar ao seu violão. Crédito:
Rafael Pedroso
A apresentação
mescla letras extremamente atuais, como “Os Pais”
(feita em parceria com Gilberto Gil): Os pais estão
preocupados demais. Com medo que seus filhos caiam nas mãos
dos narco-marginais! Ou então na mão dos molestadores
sexuais. E no entanto ao mesmo tempo são a favor
das liberdades atuais!”. Genial.
Além de folclore (“Sapo Cururu”) e vários
elementos que refletem a sua vida, o show topa-se também
com o seu livro de memórias publicado no ano passado,
a autobiografia “O filho do Holocausto”.
Através de contos e o sorriso estampado de orelha
a orelha a apresentação vai chegado ao fim.
Antes, ele não esquece de exaltar o músico
ao seu lado. Todos concordamos, trata-se de outro mestre.
Os últimos acordes do violino cantam enfim “Maracatu
Atômico”, um hino que marcou duas gerações.
Primeiro na década de 70 e, sobretudo, nos anos 90,
através da maior voz brasileira que o mangue já
viu cantar: Chico Science. A entrevista rolou depois do
show e depois ainda das tietagens e autógrafos. Saímos
pensativos, com um emaranhado de coisas na cabeça
e o principal: que venha o futuro, pois ele a nós
pertence! Jorge confirma: “A humanidade vem renascer
no Brasil!”.
Ouça, na voz de Gabriel
Ruiz, mais sobre Jorge Mautner:
___________________________________ Gabriel
Pansardi Ruiz é jornalista ainda não
graduado, reside em Bauru-SP e gosta de rock ´n roll.
É editor do jornalístico cultural "Revista
Ponto e Vírgula", veiculado pela
web rádio Unesp Virtual, onde também produz
reportagens para os programas "Raiz Social" e
"Ecoando". Mais escritos no seu
blog. Escreve todas as segundas. E-mail: gabrielpruiz@yahoo.com.br