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- Mamãe, me conta uma historinha pra eu dormir? Pergunta a menina deitada na cama enquanto a mãe a cobre. - Tá bom meu anjo, mas só uma. Responde a mãe, dando um beijo na testa da filha. “Há muito tempo, num reino distante, viviam um rei, uma rainha e sua filhinha, a princesa Branca de Neve. Sua pele branca como a neve, os lábios vermelhos como sangue e os cabelos pretos como a noite. Um dia, a rainha ficou muito doente e foi morar com o papai do céu. O rei, sentindo-se muito sozinho, casou-se novamente. O que ninguém sabia era que a nova rainha era uma feiticeira invejosa e muito malvada. Ela possuía um espelho mágico para o qual perguntava todos os dias: - Espelho, espelho meu! Existe alguém mais bela do que eu? (a mãe entoa a voz, dando vida à madrasta). E o espelho sempre respondia que ela era a mais bela de todas as mulheres. O tempo foi passando, o rei morreu e Branca de Neve tornou-se uma mulher linda. A madrasta morria de inveja. Um dia, quando perguntou ao espelho quem era a mulher mais bela ficou enfurecida ao ouvir: Branca de Neve...” A mãe olha para a filha e percebe que a criança já está dormindo. Então levanta, apaga a luz e vai deitar-se. Antes de dormir, ainda comenta com o marido sobre o encantamento dos contos de fadas. O marido entretido com um livro de gente grande não lhe dá muita atenção. O dia seguinte transcorre sem problemas. A mãe, típica dona de casa, acorda mais cedo, prepara o café, leva a filha para a escola e volta para casa. Cuida dos afazeres domésticos e, à tardezinha, enquanto espera o marido chegar do trabalho e a filha voltar do balé, começa a ler o jornal. Em meio a notícias de corrupção, taxa selic, cpi e coisa e tal, uma nota pequena, no pé da página lhe chama a atenção. A manchete diz secamente: “POR CIÚME, MADASTRA MATA MENINA DE 7 ANOS”. O que a mãe lê nas linhas seguintes é uma história com requintes de crueldade. Uma menina de sete anos, a mesma idade de sua filha, assassinada por sua madrasta, uma mulher invejosa e narcisista. Incrédula, a mãe lembra da história que contou para a filha na noite anterior. As cenas vão passando rápido em sua cabeça... Num lugar distante de um reino, viviam, aliás tentavam sobreviver, uma mulher, seu marido e sua filhinha, de sete anos. Um dia, a mulher fugiu com outro homem e abandonou a filha. O pai, sentindo-se muito sozinho, “juntou” com outra mulher. Os três levavam uma vida simples, que passava longe da felicidade. A madrasta que não tinha espelho, tinha muita inveja do amor que o marido dedicava à filha. Uma menina bonita em sua simplicidade, em sua inocência. Um dia, a menina faz uma arte, coisa de criança. A madrasta, num rompante de fúria, mata a criança. Não foi uma maçã envenenada e a criança não dorme, está morta. E não haverá príncipe encantado que desfaça o mal. E não há feliz para sempre. E a bruxa não vira pó. Mergulhada em seus pensamentos, a mãe não percebe a chegada do marido e da filha. Fica olhando o jornal e relê a manchete: “MADASTRA MATA MENINA DE 7 ANOS”. Balança a cabeça e volta à realidade num suspiro longo no qual engole lágrimas secas. Levanta e se prepara para servir o jantar. Depois do jantar, conduz a filha até o quarto, é hora de dormir. Deitada a menina pede para a mãe: - Mamãe, me conta uma historinha pra eu dormir? A mãe olha a filha e diz: - Hoje não, minha princesa, hoje não. Apaga a luz e espreita a filha. Na cabeça um único pensamento: a realidade está tão perto e tão distante de um conto de fadas. Leia também 06/04/07 |
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