
05/09/07
Um ditador, um revolucionário
e duas torcidas
A torcida atleticana é
conhecida por sua paixão e fanatismo. O amor é
cego, diz o ditado. E a massa alvinegra, movida por essa
paixão avassaladora, é capaz de cometer loucuras
e atos inimagináveis, justificados apenas pela lógica
torta do amor.
Um exemplo recente dessa história vem sido notado
por alguns freqüentadores do mineirão. No meio
da Torcida Organizada Galoucura há uma bandeira com
a imagem de um senhor de idade, com uma cara séria,
um certo René Barrientos. Em baixo, os dizeres: “O
sonho acabou”.
O torcedor mais incauto pode se perguntar: quem é
esse sujeito? Talvez um reconhecido atleticano da velha
guarda? Quem sabe um criador de alguma torcida alvinegra?
São teorias que podem surgir na cabeça do
curioso atleticano. Mas o que poucos imaginariam e o que
poucos sabem é que René Barrientos foi um
presidente militar de direita, que governou a Bolívia,
com mãos de ferro, de 1964 a 1969.
Mas o que liga a Galoucura a um ditador de direita? Difícil
de traçar um paralelo? Bem, nem tanto. Há
alguns anos que a torcida Máfia Azul, do Cruzeiro,
tem adotado a imagem de Che Guevara em suas bandeiras e
camisetas. E Che Guevara morreu nas selvas da Bolívia,
lutando em uma guerrilha, contra o governo de quem? Ninguém
menos do que René Barrientos. Ou seja, René
Barrientos se tornou um ídolo atleticano porque matou
um ídolo cruzeirense.
Não há nenhuma questão política
envolvida na escolha desse novo ícone, antes que
algum esquerdista se benza toda vez que ver a Galoucura
no Mineirão. Um funk da torcida mostra bem o espírito
da coisa “Esse cara é 22, só fez loucura,
René Barrientos, 100% Galoucura”. 22 é
uma alusão ao artigo do código penal que diz
que quem mata sobre coerção hierárquica
militar não é culpado, o culpado é
o mandante do crime. No caso da morte de Che, o culpado
não foi o soldado do exército boliviano que
apertou o gatilho, e sim René Barrientos que ordenou
a execução.
Che Guevara, René Barrientos, Comunismo, Ditadura
militar, direita, esquerda. Todos conceitos importantes
para se entender a história política mundial
do século XX, mas quando se entra no campo das paixões
futebolísticas, essas figuras e conceitos emblemáticos
se tornam apenas símbolos para embalar as rivalidades
.
E como disse o poeta “quem um dia irá dizer
que existe razão nas coisas feitas pelo coração”.
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Renato
Rios Neto é jornalista e já foi vocalista
da banda Carahter, que teve um CD lançado, mais algumas
músicas gravadas por aí e fez turnês
pelo Brasil, América do Sul e Europa. Ele se considera
um boxeador frustrado e também apaixonado por literatura.
Fale com ele:
xrenato82x@gmail.com
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