08/03/07 - Quinta-feira

Caminhos por onde andei

“Chuta a bola Baxinho, toca, deixa de ser fominha”.

Sempre estávamos descalços; o negro do asfalto ficava dias na sola dos pés. Precisava de alguns “na de fora”, pois a decida, e que descida, era de deixar qualquer dupla cansada. “Pare bola”, gritava o Ciene. Parecia até marcação, era começar a jogar bola na rua e um passar de carros e pessoas sem fim se iniciava. Não tinha importância, valia a pena esperar. Algumas discussões e brigas aconteciam, mas tudo não passava de uma gostosa brincadeira. As duplas eram formadas aleatoriamente, isso fazia com que as amizades acontecessem. A bola nem sempre era das melhores, não tinha muita importância. Os gols eram feitos por pequenas pedras.

De repente parei de brincar de bola na rua, precisei trabalhar com meu pai.

Com as pernas todas arranhadas e cortadas saíamos do meio do mato com papagaios nas mãos. Espinhos e cercas de arame farpado não importavam. À noite, depois do banho, descobríamos que importavam sim. A coleção de papagaios embaixo da cama já atingia os 30, ou mais, não me recordo bem. Do alto daquele barranco, onde Lia e Geraldo moravam, fizemos história. Quase todo dia, no final da tarde, íamos empinar nossos papagaios. Era muito bom.

De repente parei de colecionar papagaios, precisei estudar em dois horários.

Ah! E as baladas. Quantas noites boas. Pracinha, as mesmas pessoas, era divertido. Vez em quando pintava algum rosto diferente. Quando isso acontecia era um galantear de olhares sem fim. E o Breno, quanta bagunça! Já corremos muito; e as negociações: “Que isso cara, ninguém olhou pra sua namorada não. Ainda mais você que é sangue bom.” É, as gírias eram gostosas. Falávamos sem preocupações.

De repente parei de ir à pracinha, precisei assumir mais responsabilidades.

E os lotes a capinar. Ah! Baxinho e eu tínhamos fama de barateiros e bons de serviço. A grana que levantávamos era, sempre, depositada no fliperama do bar do Zezé. Baxinho e eu zerávamos constantemente aqueles jogos. Por fim, não éramos mais bem-vindos, pois com uma ficha ficávamos muito tempo. Prejuízo para o Zezé.

De repente parei de capinar quintais e jogar fliperama; precisei trabalhar de carteira assinada.

Hoje, quando volto à casa dos meus pais, um misto de nostalgia e alegria me invade. Sinto uma alegria pulsante em rever meus irmãos, meus pais. Quanto aos velhos amigos, alguns casaram, outros mudaram, tantos não tenho notícias. O lugar que parecia ser tão infinito, se mostra distante, carregado de lembranças. A rua do futebol está vazia; a coleção de papagaios está sem dono; as baladas já não embalam, os quintais estão capinados.

Um pouco daquele lugar encantado cresceu comigo. A magia dos tempos de criança e adolescente permanece na memória. Tudo aconteceu assim mesmo, tão de repente.

De repente parei de viver a doçura e a inquietude dos tempos de criança e adolescente; precisei estudar jornalismo. Me formei. Des (entendi) muitas coisas.

De repente precisei escrever. Quanto a isso, sei que é um aprendizado contínuo.

Sempre haverá muitos caminhos por onde andar... Ainda bem!


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Gledson José Machado é jornalista, amante da literatura, da poesia e das escritas. É assessor de comunicação da Açoforja. Escreve todas as quintas-feiras.
E-mail: gledsoncd@gmail.com

 
 

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