Além dessa falta de apoio do governo ou até mesmo de empresas privadas, a mídia também é um dos responsáveis pelo não crescimento do futebol feminino. A falta de interesse pelas partidas e pelas informações sobre o que acontece no esporte gera a desmotivação entre os brasileiros.
 

28/09/07
Será que agora vai?

Muito se falou nesses últimos dias do tal drible da foca realizado pelo meia Kerlon do Cruzeiro no clássico contra o Atlético. Compararam o jogador a Ronaldinho, Garrincha, Pelé. Ah, Pelé... Pra mim é demais. No futebol feminino sim, temos uma jogadora comparada a esses gênios: Marta. Que habilidade, que visão de jogo, que ginga, que malícia. Acho que qualquer elogio é pouco para descrever a genialidade dessa... como dizer, gênia. (me desculpem a repetição, mas não há outra palavra a ser usada).

O Brasil enfrentou os Estados Unidos, uma das grandes potências em se tratando de futebol feminino. O técnico estadunidense, antes mesmo da partida começar, disse que a equipe brasileira batia muito e mudou a goleira titular com receio do nosso ataque. Porém, o que se viu em campo foi o contrário. As norte-americanas chegando junto, não dando espaço, e, às vezes, até mesmo desleais, como no caso em que deram uma cotovelada sem bola em Marta, ignorada pela arbitra suíça, Nicole Petignat. Justiça feita, elas tiveram uma jogadora mal expulsa no final do primeiro tempo, Shannon Boxx. Mas nesse período o Brasil já sobrava em campo e vencia por 2 x 0.

No segundo tempo sobrou show, comandado, claro, por Marta. O quarto gol diz tudo. Um elástico/lençol na camisa número 8, Ellertson, que entrara pouco antes com o objetivo de marcá-la. Um drible em Llody e a bola na rede. Que jogadora! Mas a equipe feminina de futebol brasileira não se resume a camisa 10. No gol, a arqueira Andréia, que dá segurança a zaga, apesar de uma pequena falha, não resultada em gol, no jogo das semifinais e outra, nas quartas, em que a Austrália aproveitou e marcou. Nesse jogo, inclusive, em que as brasileiras eliminaram a equipe da Oceania por 3 x 2, a camisa 1 da seleção brasileira sofreu o primeiro gol em partidas oficiais após 881 minutos. No meio campo duas grandes jogadoras, que combatem o tempo todo, não aparecem tanto na partida, mas são essenciais para a mobilidade de Cristiane, Marta e Daniela Alves: Formiga e Ester, a última considerada a melhor em campo, na minha opinião, depois de Marta, é claro.

Porém, não estou aqui para elogiar o óbvio. Mesmo se o Brasil vencer a Alemanha na final, que vai acontecer no domingo, há inúmeros problemas e lacunas a serem preenchidas. O futebol feminino brasileiro é extremamente amador e faltam recursos e apoios. Contudo, temos um ingrediente que poucos outros países possuem: amor ao futebol e a chamada “ginga”.

Estive em 2002 nos Estados Unidos e acompanhei a Copa do Mundo de futebol masculino nesse país. Apesar da boa campanha (os estadunidense foram eliminados pela Alemanha nas quartas de finais) não havia nenhum interesse pela competição. O pouco abordado na mídia mostravam pessoas que não entendiam como alguém pode gostar de um esporte sem contato físico, team lider, e que 4 x 0 já é um placar elástico. A única partida transmitida ao vivo em TV aberta foi a final entre Brasil x Alemanha. Tudo bem, o futebol masculino não é de interesse desse país, mas para o público até mesmo o futebol de mulheres é um tédio. Falta uma “aura”, uma vontade, um “q” de Brasil. E podemos comprovar isso pela partida de hoje. Mesmo sem nenhum incentivo, conseguimos, ou elas conseguiram, despachar a seleção dos Estados Unidos com uma sonora goleada e uma aula de como jogar futebol.

Além dessa falta de apoio do governo ou até mesmo de empresas privadas, a mídia também é um dos responsáveis pelo não crescimento do futebol feminino. A falta de interesse pelas partidas e pelas informações sobre o que acontece no esporte gera a desmotivação entre os brasileiros. Para se ter idéia, na Copa do Mundo de futebol masculino, realizada ano passado, toda a mídia estava voltada para a disputa, inúmeros jogos exibidos pela maior rede do país, ruas pintadas, serviços interrompidos durante as partidas da seleção brasileira, jornais com destaque, quase exclusivo, ao assunto. Resultado: um futebol medíocre e a eliminação nas quartas de finais.

No campeonato disputado pelas mulheres essa tal grande rede, detentora dos direitos de exibição dos campeonatos que desejar, abriu mão e os jornais, principalmente os telejornais, parecem que exibem o fato apenas por obrigação. Uma notícia da vitória do São Paulo frente ao Boca Juniors tem mais relevância do que uma vitória inédita em Copa do Mundo frente as norte-americanas. Isso porque as garotas estão bem melhor que os marmanjos: além de disputarem a final, estão jogando um futebol magistral. Imagina se tivessem sido eliminadas na primeira fase? Nem divulgado seria.

Mas aí vem um leitor e me pergunta? Não acha que está colocando muita responsabilidade na imprensa? Sim, estou, justamente porque acredito no poder que ela possui. O poder da televisão, principalmente, pode fazer com que o esporte consiga de expandir e gerar frutos ainda maiores de pequeno a médio prazo. E mais um detalhe: hoje uma das maiores fontes de renda dos clubes de futebol masculino é advinda dos direitos de exibição das partidas. Se isso ocorresse com o futebol feminino já seria um grande início.

Para finalizar, mais uma indignação: quando ocorrem efeitos como esse, em que o Brasil chega à final de uma Copa do Mundo ou Olimpíadas ou vence, de forma arrasadora, o Pan-americano é fácil incentivar. Porém, é também necessário dar forças as atletas quando o esporte está em baixa, pois só assim não acontecerá o que ocorreu, por exemplo, no caso do tênis: inúmeras crianças e jovens entusiasmados com a grande fase de Gustavo Kuerten, tricampeão em Rolland Garros, desistiram por falta de incentivo. E assim, uma geração inteira de tenistas foi desperdiçada...

 

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João Paulo Teixeira é jornalista, pós graduando em “História da Cultura e Arte”. Tendo estudado na Escola Livre de Cinema, participou de inúmeros filmes como continuísta. Acredita que a continuidade é responsável direta pelo olhar mais crítico para o fazer e analisar obras cinematográficas. Escreve mensalmente para a Coluna Retalhos Culturais. Contato: jpteixeiras@yahoo.com.br


 
 
 
 

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