
30/04/07
Reféns da tecnologia
Novas tecnologias, muitas vezes, me deixam confuso. Se, hoje, sou crucificado por não estar presente virtualmente, em alguma situação, por outro, perco o direito de cobrar presença real em um aniversário, justamente quando um respeitoso e-mail, cheio de carinhas e desenhos que pulam e cantam em silêncio (sim, meu computador não tem som), desponta em minha caixa postal. Alguém entende?!
Nunca tive a pretensão de ignorar o avanço tecnológico. Pelo contrário! Observá-lo em seu impacto sobre as pessoas pode render momentos singulares de diversão e até dilemas existenciais (para delírio dos mais dramáticos). Afinal, tudo que abre caminho para a pluralidade de avaliações (que, vale lembrar, partem tão-somente de deduções) gera entraves épicos, sobretudo no que diz respeito ao clássico momento de "convencer o outro de que a opinião dele, por ser diferente da minha, está errada".
Uma situação hipotética, para ilustrar, seria uma briga num comunicador instantâneo de grande popularidade por conta de uma ausência no dia anterior. "Você não me respeita, me abandonou ontem na internet". Comovente, é fato. No entanto, a mesma pessoa, com cara lavada, diz que, ao esquecer-se de dar um telefonema em uma dessas noites da vida, não teve qualquer culpa. "Ah, esqueci, oras. E telefone nem aproxima tanto assim. Há uma distância física com a qual não concordo e...". Blá, blá, blá... e blá.
Em momento de transição de hábitos, com modernices falando mais que a própria essência humana, caímos num campo de duelos umbiguistas. Ou seja, as novas tecnologias só são saudáveis se facilitam a minha vida. Do contrário, representam uma escolha egoísta do outro que, num total ato de "desrespeito", tem o descaramento de lhe enviar uma mensagem no celular com os parabéns pelo casório (e não pelo "correto" e "chique" telegrama).
E nisso eu me divirto no reino das interpretações particulares e das eternas puxadas de sardinha. Caras-de-pau... Agora, se me dão licença, vou mandar um e-mail convidando a minha colega de trabalho, com quem divido uma sala, para irmos tomar um café...
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Guilherme Amorim
é um mineiro simples, metido
a organizado e que sobrevive sem estantes. Além de
devoto da Mega Sena, irônico e canhoto fervoroso,
é jornalista e criador/apresentador do programa Espátula,
veiculado na iRadio. Escreve mensalmente na coluna Trejeitos.
E-mail: guilbh@gmail.com
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