OPPERAA
 
Baby Boom
     
 
 
     
Sobre a mesa, uma valsa, com a dama da noite. Mais nada. E precisa?

27/07/07
Dama da Noite

Roda de bar não define personalidade. Do lado de cá, ele banca. Acolá, protestam. Sorrisos e gestos. “Cuidado com os copos”, tenta o garçom, sem sucesso. Um cigarro? “Já basta um vício”. Mais mesas. Acabaram-se as cadeiras.
- Puxa uma cadeira e senta no chão!

Sempre alguém para fazer essa piada. Um tapa nas costas. A dor vem em cinco segundos. Bebida tira os nossos reflexos? “Não sei do que você está falando”. Mais copos balançam. E dá-lhe garçom preocupado.
Flertar em bar não é proibido. Falar, talvez. Pode sair embolado. É feio gaguejar no cortejo? Ou é a palavra cortejo que é feia? Diante da moça, já não lembra porque se levantou.
- Quer o meu telefone?
- Não.
- O que você quer?
- Você não é ela. – e saiu.

Rostos amigos, vozes familiares. Conta uma piada. Gargalhadas uníssonas, algumas forçadas, outras nem tanto.
- Não achei graça.
- Azar o seu, eu não te conheço.

Era a irmã dela. Claro que conhecia. “Pergunto sobre a Laura?”. Não, pois ninguém quer saber de seu drama. Seu velho amigo, de frente, com um violão, espanta os males.

- Raul Seixas realmente apanhou em uma apresentação ao vivo, quando ainda não era conhecido pessoalmente?
- Por que isso? A música é do Cazuza.
- Mas poderia ser do Raul.

Não sabe seu partido. Não, não sabe, Cazuza, não insista. Aceitar um coração partido é mais difícil. “Quase meia-noite. Ela não vem mesmo”. Animados são os outros, ele está sozinho.

Um vestido vermelho flutua. Sim, são loiras madeixas. Sim, são olhos azuis. Não, não é a Xuxa. “Por que os artistas não vêm mais ao meu Estado?”.

Um jornal na mesa.
- Isso é hora de coisa séria?
- E quando será?
- Em 2018.
- Até lá.

Daria tempo. Filhos? Casamento? Carreira? “Quem será candidato à presidência em 2018?”. Batatas transgênicas. Fazem mal. Não fazem. Não sabe que mal? O benefício também o outro não sabe.

- Melhorar a natureza de algo é melhor para ‘o algo’ ou para você?
- Não sei, odeio batatas.

Lucinha vai embora. Os primos também. Seu amigo guarda o violão, faz sinal de garganta seca. “Também estou cansado”. A irmã dela aponta para a outra mesa. Talvez fosse a hora. Talvez não, mas já era tarde. Falou.
- Sua irmã não vem? – ele finalmente questiona.
- Pensei que nunca fosse perguntar.

A expressão era confusa, sobrancelhas dançavam. Sorriso maroto? “Por quê?”. Agora, quem ainda estava lá sorria. Do balcão, os garçons vinham em fila. “Deus do céu, só falta surgir um bolo. Esqueci o aniversário de quem?”.
- Oi.
- V-você?
- Achou que ia se livrar de mim?

Palmas e círculos. Cercado, entre braços e abraços. “Não, não é meu aniversário. Ou é?”. Talvez fosse um sonho. Ou loucura alheia. Não quer subir, mas o carregam à mesa. Ela já estava lá.
- Não sei o que dizer, não é meu aniversário.
- Eu sei o que dizer. E a resposta é “sim”.

E o garçom segurou a ira ao ver sal e copos amortecerem os atabalhoados movimentos dos pés indomáveis do rapaz. Sobre a mesa, uma valsa, com a dama da noite. Mais nada. E precisa?


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Guilherme Amorim é um mineiro simples, metido a organizado e que sobrevive sem estantes. Além de devoto da Mega Sena, irônico e canhoto fervoroso, é jornalista e criador/apresentador do programa Espátula, veiculado na iRadio. Escreve mensalmente na coluna Trejeitos. E-mail: guilbh@gmail.com

 

   
 

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