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Tenho bons e especiais amigos que, ainda numa situação com menor impacto global, como a simples definição de um flerte ou namoro potencial, se encontram divididos quando o tema é fidelidade. Uns vão dizer que, em alguns casos, ela é questionável; outros já vão, com severidade e punhos fechados, bradar, aos quatro cantos do país, que ela é o mínimo de respeito que, num relacionamento, alguém pode ter por outra pessoa.

15/10/07
Fidelidade*

Longe de mim querer chamar os brasileiros, em sua totalidade, de perspicazes infiéis. Tampouco tenho aqui a intenção de julgar quem quer que seja, ainda que a polêmica do tema recaia sobre valores, antes de tudo, morais.

Tenho bons e especiais amigos que, ainda numa situação com menor impacto global, como a simples definição de um flerte ou namoro potencial, se encontram divididos quando o tema é fidelidade. Uns vão dizer que, em alguns casos, ela é questionável; outros já vão, com severidade e punhos fechados, bradar, aos quatro cantos do país, que ela é o mínimo de respeito que, num relacionamento, alguém pode ter por outra pessoa. O ponto é que, já aí, na raiz de sentimentos, no universo restrito dos meus próprios amigos, a tal fidelidade já é vista sobre prismas diferentes, muitas vezes pela própria conveniência de quem a invoca ou descarta.

Pois bem. Agora, amplifiquemos o quadro. Imagine os meus tais amigos transformados em representantes públicos, ‘logomarcados’ por partidos e linhas ideológicas truncadas, fazendo juras de amor – não mais a uma pessoa, mas a tantas outras (e ao mesmo tempo). Com absoluta eficiência e jogo de palavras, meus agora políticos amigos convencem as suas platéias e ganham um voto de confiança em massa, daqueles que se deixaram levar, ingenuamente, por promessas pomposas, sem qualquer indício de conteúdo. Está fechado, aí, um contrato, com moldes questionáveis que ninguém, em momento algum, retorquiu e nem demonstrou parcela ínfima de boa vontade para refletir sobre a organização política brasileira.

O tempo passa e um dia não vem à porta um senhor de alta classe com dinheiro na mão. Na verdade, apresentam-se novos santinhos, com a foto do representante público no qual todos os destinatários da propaganda política depositaram total confiança. Com o folheto em mãos, nossos nobres eleitores notam que o político, desta vez, está ‘logomarcado’ de uma forma diferente. “Mas e daí?”, pensa o Dionísio, da rua 23. “Eu depositei a confiança foi na pessoa e não no partido”, conclui. E, a ele, tantos outros se juntam, clamando, pela voz da maioria, que a fidelidade partidária é uma grande bobagem. E eu escuto a tudo tranqüilo, registrando cada detalhe e, principalmente, atento a mais um momento em que a lealdade assume facetas diferenciadas, de acordo com a demanda de seus clientes.

Então, chego ao meu modesto computador, pensando nas dúvidas de meus amigos sobre o que é o respeito ao outro, o que é a fidelidade num relacionamento e quando é que ela se torna indispensável. Penso que, no Brasil, mais uma forma se deu para que operasse o ‘jeitinho brasileiro’, levando à fidelidade um leve e ascendido asterisco que, a ela, passa a conferir a possibilidade de se desdobrar em alternativas e conveniências.

Só me resta concluir que errado estou eu de não perceber que, se Dionísio hoje “namora” com o seu representante público, então o relacionamento que o político mantinha com a sua legenda, iniciado bem antes, pouco importa. Tudo isso porque a fidelidade incomoda apenas aos olhos de quem por ela se vê atingido. E, claro, Dionísio irá concordar: antes traído o outro que ele próprio. Não é?

Uma rodada a todos, em nome da promiscuidade.


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Guilherme Amorim é um mineiro simples, metido a organizado e que sobrevive sem estantes. Além de devoto da Mega Sena, irônico e canhoto fervoroso, é jornalista e criador/apresentador do programa Espátula, veiculado na iRadio. Escreve mensalmente na coluna Trejeitos. E-mail: guilbh@gmail.com

 
 
 

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