22/04/07
ENTREVISTA FU!
Em ponto
alto da carreira, Fernanda Takai e John falam sobre os discos
da banda com que mais se identificam, a formação
do grupo e sobre a turnê internacional além
mar
Pato
FU: Lulu, John, Fernanda Takai, Xande
e Ricardo Koctus) - Crédito: divulgação
Em 93 a banda mineira Pato FU começava a dar as caras
no país. Foi nesse ano gravaram o experimental e
despretensioso “Rotomusic de Liquidificapum”.
Mas somente com o segundo trabalho, “Gol de quem?”
de 1995, que ganharam notoriedade (com músicas tocando
no dial). “Sobre o tempo” emplacou nas rádios
projetando os “Patos”, que a esta altura já
haviam assinado com a gravadora BMG. Depois vieram os álbuns
“Tem mas acabou” de 96 e, dois anos mais tarde,
o “Televisão de Cachorro”, já
com o produtor Dudu Marote. Ambos mostraram que o grupo
não era mais uma promessa da indústria fonográfica
e as músicas continuavam rolando nas FMs do país.
E o Pato FU
iria evoluir ainda mais. Em 99, lançam mais dois
com o produtor Dudu Marote: o sonoro “Isopor”,
incluindo os sucessos “Depois” e “Perdendo
os Dentes”. Na seqüência, em 2001 produzem
“Ruído Rosa”. O disco exibe um Pato Fu
maduro musicalmente e com John Ulhoa experimentando sons
no seu estúdio caseiro em Belo Horizonte. “Ruído
Rosa” apresentou 8 das 13 faixas mixadas num estúdio
em Londres - diz-se, um antigo sonho do Pato FU. Nesse momento
a banda aparecia na cena do pop-rock brasileiro não
apenas com sucessos radiofônicos, mas principalmente
por sua plasticidade.
E a veia criativa
não ia parar por aí. Em 2005 gravam “Toda
cura para todo mal”. O processo de criação
do disco, assinado por John, soa como o grande diferencial
de um belíssimo trabalho.
Após
ouvir o álbum “Toda cura para todo mal”
inteiro, fiquei bastante surpreso. Aquele era o Pato FU
que eu conhecia? A sonoridade deixou-me inquieto. Resolvi
enviar um e-mail para conversar com a banda a respeito.
Poderia imaginar que qualquer pessoa me responderia, menos
a própria Fernanda Takai. A vocalista mineira foi
simpática e solícita, respondeu aos meus questionamentos
sobre o disco rapidamente.
Depois de um
mês o Pato FU realizaria um do últimos shows
da turnê do “toda cura”, em Bauru. Era
a chance para conhecer os “patos” e dialogar-entrevistá-los
acerca da carreira que está para completar 15 anos...
Já no
Sesc, na passagem de som, antes da coletiva, eu, o Jean
Kleber aguardávamos. Na espera, ganhamos de presente
duas músicas: “Eu” (com a doce Fernanda
empunhando uma guitarra Dean, aquela modelo “Rabo
de peixe”) e “Amendoim”. Em seguida, seguimos
para a coletiva. Sentamos em uma grande mesa de madeira,
de frente para os “patos”. A Fernanda disse,
“ei, pode sentar mais perto da gente!”. Nos
aproximamos, claro e iniciamos, sem antes ouvir o John preocupado
com o aquecimento global: “Apaga logo esse negócio
(a iluminação da equipe de TV), pois isso
contribui para o aquecimento do planeta!”...
Você
acredita que o Pato FU evoluiu para uma música mais
pop no decorrer da carreira? Porque os primeiros, soavam
mais experimentais...
Fernanda: eu acho que nos três primeiros
discos tinha música pop também. Mas particularmente,
eu prefiro os três últimos discos aos três
primeiros. Eu me identifico mais com as coisas que eu canto
hoje, com o som que a gente tem hoje. Acho que no começo
os discos serviam pra mostrar um pouco da desorganização
que nós tínhamos, de querer colocar tudo num
disco só; tanto que, principalmente no primeiro e
no segundo discos, basicamente eram os mesmos repertórios.
Quer dizer, os shows do Pato FU em 92, 93, 94 era feito
daquelas músicas. Só que algumas saíram
do “Rotamusic” e outras saíram do “Gol
de quem?” que foi gravado em 94, mas só saiu
em 95. E o “Tem mas acabou” foi uma fase de
transição mesmo da gente. De começarmos
a compor um material mais recente para aquele disco e não
aquele repertório que vínhamos fazendo nos
shows que nem sabia se a banda ia continuar, era um show
por diversão mesmo.
Após
uma breve pausa, a Fernanda Takai indaga o John, que estava
sentado ao seu lado direito: “é isso John?”.
e o John responde meio tímido, “é...
mais ou menos!” E todos ali próximos caem na
risada. Takai, que vestia uma camiseta do VMB (da MTV),
explica: “é que o John é que foi o nosso
mentor!”...
E é
verdade que tudo começou em uma loja em BH? Como
foi isso?
Fernanda: é
verdade.
John: então,
nos anos 80 eu tinha uma outra banda chamada “Sexos
Explícitos” que durou dez anos e quando essa
banda acabou eu tinha ido morar em São Paulo com
os caras e voltei pra BH. Lá, eu montei uma loja
de instrumentos musicais e comecei a pensar em montar uma
banda, mais para me divertir, menos aquela coisa de a gente
vai tentar ver se a coisa acontece que toda banda faz. Pensei,
“vou abrir uma loja de instrumentos e ganhar uma grana
não como músico, mas dos músicos!”
E aí o Ricardo [Koctus] era vendedor e a Fernanda,
cliente...
Fernanda [interrompendo
John]: e o Xande [Tamietti] era muito novo e a mãe
dele não deixava ele ir no centro sozinho. Ele não
podia ir lá na loja! (risos)
John: Mas aí a gente fez a banda. A idéia
era fazer shows sem muita pretensão de seguir uma
carreira e nem nada, mas ela aconteceu muito mais do que
meus projetos e bandas anteriores.
E Fernanda,
você lembra o que ia comprar na loja?
Fernada: eu
comprava palhetas, cordas, coisas baratas, não tinha
dinheiro. A coisa mais cara foi um splash [tipo de prato
de bateria] de 10. Baratíssimo, pro meu irmão
que tocava bateria.
John e Fernanda Takai em momento de
produção)
Crédito: http://geocities.com/patofulogia
Sobre
vídeos-clipe que vocês fazem, eles não
são tão genéricos como a maioria das
outras bandas, têm vários que são animações.
Queria que vocês falassem a respeito...
Na resposta, o John e a Fernanda discutem entre si a respeito
do assunto...
John: eu gosto de animação, gosto de
todas as técnicas. Daí, têm clipes que
colocamos muito a mão, tem outros que a gente convida
diretores que gostamos, que os caras já vêem
com as idéias deles. Porque têm caras muito
bons na área.
A banda tem
um conceito assim. Tipo, a gente gosta de determinadas coisas,
não gosta disso ou daquilo. E acabamos procurando
pessoas que de uma maneira ou de outra possuem idéias
parecidas e raramente a gente se decepciona. A gente fala:
“ó pode fazer o que você quiser, se quiser
a banda aparece ou não”.
Fernanda: acho que o que mais gostamos é quando a
banda não precisa aparecer. Porque com o resto é
ao contrário, “não a banda precisa aparecer”
igual bonequinho. E a gente não, se precisar a gente
vai mas...
John: mas também teve poucos vídeos que a
gente apareceu né?
Fernanda: não, desses três últimos...
[Agridoce (Conrado Almada), Vida Diet (Hugo Prata), Sorte
e Azar (TV Zero)]
John: é realmente desses aí...
E o
DVD “toda cura para todo mal”, vai sair mesmo?
Fernanda: o negócio é assim. Esse DVD ele
está pronto mesmo, tanto que alguns críticos
fizeram as resenhas, eu mandei uns DVD-R. Ele está
pronto desde o final de maio. Era para ter saído
em agosto e por uma série de infelicidades da fusão
da Sony e da BMG, um monte de artistas, sei lá uns
70 artistas, começaram todo mundo a lançar
e foi ficando para depois, depois... claro, para depois
dos outros que vendem muito mais! E aí disseram,
“ah, vai sair no natal”. E aí não
saiu no natal, então foi indo e agora vai sair para
a páscoa! Mas agora vai sair mesmo porque a gente
já comprou as nossas cotas, a gente já pagou.
E dia quinze eles ficaram para entregar pra gente e o show
que fizermos na vila Mariana em São Paulo (24/03/07)
provavelmente já colocaremos para vender. Tivemos
um monte de burocracias, depois teve aquele selinho do Ancine
que classifica agora [a faixa etária do público]
e aí parou em Brasília e o nosso não
entrava, entrava o de todo mundo. E aí quando foi
a moça para assistir ao nosso lá, estava riscado,
então ficou aquele negócio de “eu vou
estar pedindo pra vocês estarem enviarem outro”
e no fim demorou mais um mês e meio isso tudo, mas
finalmente saiu.
É um
DVD com 13 clipes mais o making off do disco, mais a turnê
na estrada, mais um monte de coisas. São duas horas
de material!
John e a filha do casal, Nina no estúdio
caseiro da banda)
– Crédito: http://geocities.com/patofulogia
Sobre
a mini turnê que vocês fizeram na Europa, como
foi?
Fernanda: acho que foi mais um sonho que a gente tinha de
como as pessoas recebiam a nossa música. Lá
em Portugal achamos que teria mais brasileiros e teve mais
portugueses na platéia. E em Londres, tivemos uma
surpresa excelente porque tinha bastante brasileiro, mas
a casa que tocamos estava lotada, foi uma casa bem tradicional
do britpop. É como começar uma outra carreira
lá fora. Fomos com uma equipe super reduzida, a gente
mesmo carregando as coisas. Mas é uma vontade que
a gente tem. Se pela internet temos um retorno tão
bom de pessoas de outros países escrevendo pra gente
em inglês, tudo, querendo saber mais sobre o Pato
FU, se vamos nos apresentar nos países, então
foi um bom sinal que dá pra fazer essa carreira.
Só que precisa investir muito tempo.
Ei
para você John, como foi ter produzido o último
CD do Pato FU?
John: não
foi uma coisa muito inédita assim, porque eu sempre
fiz a co-produção e a pré-produção
dos discos e nesses outros discos que eu havia trabalhado
já. Eu tinha feito essa produção junto
com alguns dos melhores brasileiros como o Dudu Marote [que
produziu os álbuns “Televisão de Cachorro”,
“Ruído Rosa” e “Isopor”],
com Savala, com André Abujamra, que são caras
que tem muita manha e fui aprendendo bastante com eles.
E justamente
nesse último disco que vimos que a gente teria um
tempo grande para fazê-lo e eu já tinha feito
um estúdio em casa, já tinha produzido outras
bandas, então, resolvemos fazer também...
E o
disco novo tem música pronta já?
Fernanda: tem,
já começamos a gravar! Nosso desejo é
que ele saia no início do segundo semestre.
E no
show vocês vão tocar alguma nova?
John: é
que uma coisa é gravar e outra coisa é tocar.
Somos uma banda que grava muito separado e fazendo jam session
na frente do computador. Depois que vamos gravar é
que aprendemos a tocar. É um método meio bizarro,
mas é assim que a gente faz.
Fernanda: e
quando viemos para Bauru da outra vez, o público
não viu o show do “toda cura”, então
falamos, “ah, vamos tocar o repertório da turnê
do toda cura e depois a gente volta para fazer o disco novo”.
Começo
da carreira, raridade: o visual da fita demo do Pato FU)
Crédito: http://geocities.com/patofulogia
Sobre
os Mutantes, Fernanda, ouve mesmo um convite para tocar
com eles ou foi só especulação?
Fernanda: foi uma... embora o termo seja deveras geológico,
foi uma sondagem. Perguntaram-me se eu gostaria de cantar
e eu disse: “claro, gostaria, mas só que eu
tenho uma banda, não posso confirmar tudo, não
posso falar que vou fazer”. Se fosse pra fazer um
show só, claro teria ido, mas tinha a turnê
nos EUA, tinha mais shows. Eu coloquei a verdade, seria
ótimo para a minha carreira, mas eu tenho uma banda
que está em atividade, então nem para eles
eu seria a pessoa mais indicada. Acho que a Zélia
[Duncan] que é uma cantora solo, que aliás
é super amiga, que está sempre em casa, conhece
a Nina, fiquei super contente de ter sido ela. É
muito competente, muito versátil e é o perfil
ideal para uma banda que chamou alguém pra cantar
agora, porque ela mesma faz a agenda dela, então
ela pode se adequar...
E vocês
acreditam que a maternidade tenha ajudado muito na questão
da produção musical?
John: a minha maternidade? (risos)
Fernanda: por exemplo, “Amendoim” que é
uma música que fala sobre bebês, ela é
da época do MTV ao vivo, a gente nem sabia que teríamos
neném. Não sei assim, a gente esperou tanto
tempo para... influenciou assim, no geral...
John: influenciou assim indiretamente, como a gente passa
muito tempo em casa, produzimos melhor, fizemos arranjos
melhores. Talvez no próximo disco tenha alguma influência
um pouquinho mais audível, mas no disco anterior
não. É mais essa coisa do tempo, mas não
nas composições, esse tipo de coisa. O som
vem de antes.
Uma curiosidade, no setlist dos shows, como vocês
fazem quando querem optar por um setlist que não
seja com as músicas que tocaram nas rádios,
um setlist “lado B” assim. Se de repente, é
complexo ou não deixar de fora as canções
populares da banda...
Fernanda: no repertório desse show, por exemplo [turnê
“toda cura para todo mal”] têm nove ou
dez músicas do disco novo, o que não é
tão comum assim. Quando você lança um
disco, você faz três ou quatro. No caso, o repertório
são nove músicas do último disco e
as outras são músicas boas de show, não
necessariamente porque são sucessos. Tem música
que foi muito sucesso e não está no show,
como “pinga”, “OB-LA-DI [OB-LA-DA]”.
Também a gente não tem tantos sucessos assim.
O que é difícil é você chegar
a um consenso de quais são as músicas que
vão compor aquela turnê. Então a gente
faz uma listinha, depois vê quais foram as mais votadas,
depois as segundas mais votadas e aí fecha o repertório
e sai em turnê com aquele repertório. E dificilmente
no meio da turnê a gente decide tocar uma que não
está no repertório, mas... acontece. Vai acontecer
lá no Sesc Vila Mariana [show 24/03/07].
E como
está sendo a experiência de gravar independente,
fora de uma grande gravadora?
John: não
mudou muito na nossa carreira não. Porque mesmo dentro
da gravadora a gente brigou muito. Dizia, “olha, a
gente sempre vem com projeto pronto, a capa, as idéias,
sempre demos muito palpite e tivemos sempre muito retorno
positivo sobre isso”. As pessoas acreditavam muito
na nossa carreira.
E eu não
percebo tanta diferença, a não ser que eu
fico muito em casa, a gente grava na casa da Fernanda e
do John porque a gente tem um estúdio lá.
E isso na época da gravadora talvez fosse mais complicado,
porque os caras querem tirar por fora. E eu acho que o que
mais muda é isso, porque a forma de composição
e como a gente conduz a carreira, a gente sempre a conduziu.
Fernanda: Não
tem um orçamento de uma gravadora, não tem
um dinheiro de gravadora pra gente fazer o disco, porque
o estúdio é nosso então a gente mesmo
que se banca e depois o disco vai ser distribuído.
É uma forma que talvez seja uma saída para
todo o mercado da música hoje em dia, porque as gravadoras
estão totalmente no vermelho. Por mais que venda
disco, quem mais vende disco, vende 350 mil cópias,
antes era 1 milhão. Então eles não
sabem lidar com isso. Eles agora querem o business dos shows
também.
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Gabriel
P. Ruiz é jornalista, reside em Bauru-SP,
gosta de rock ´n roll e vive usando a desculpa de
entrevistar as bandas para conhecê-las. É editor
da Revista Ponto e Vírgula da web rádio Unesp
Virtual, onde também produz o programa On the Rock!.
Mais no seu blog (wwwggabrielruiz.blogspot.com). Escreve
todos os domingos. E-mail: gabrielpruiz@yahoo.com.br
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