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ENTREVISTA

19/04/07
Com a palavra, os controladores

Por Thaís Palhares
(Colaboradora O Binóculo)

Muito tem se ouvido falar do apagão aéreo. Mas, em meio a tantas vozes, não se ouve a dos principais envolvidos: os controladores de vôo. O motivo do silêncio não condiz com o ditado “quem cala consente”, mas sim com o medo. O serviço de segurança tem controlado os passos e pressionado os controladores a manterem o silêncio.

Encontramos dois controladores dispostos a falar com exclusividade para O Binóculo, mas sob uma condição: a de não se identificarem. A justificativa é simples, mas assusta, pois contradiz a democracia e o direito a liberdade de expressão: “Não queríamos que fosse dessa forma, queríamos expressar a verdade de cara aberta, usufruir o direito da liberdade de expressão, mas se o fizéssemos, amanhã estaríamos presos e perderíamos as possibilidades de concurso público na área federal”.

Os controladores, que pertencem a órgãos distintos – um de ACC (Centro de Controle) e outro de APP (Controle de Aproximação de Vôo, aceitaram falar ao O Binóculo na tentativa de passar os bastidores do caos aéreo. A entrevista, você confere agora.

Desde o final do ano passado, há constantes atrasos e cancelamentos de vôos. A princípio, os problemas teriam sido causados pela operação-padrão dos controladores, que restabeleceram à força parâmetros internacionais de segurança. Depois foi alegada a falha nos equipamentos. Toda essa situação só veio à tona depois da queda do Boeing da Gol, em setembro do ano passado, por quê?

Acredito que o termo “à força” não seja o adequado. Como controladores de vôo temos que cumprir as determinações dos regulamentos. O grande problema é que, muitas vezes, somos “obrigados” a descumpri-las para agilizar o tráfego, como nos momentos de pico. Porém, diante do ocorrido com o Boeing da GOL, aliados às deficiências operacionais dos equipamentos, ou seja, por circunstâncias – não por força – foi necessário rever conceitos e aplicar as regras mais seguras possíveis, utilizando-se desta forma as regras internacionais de segurança, visto que o serviço de tráfego aéreo é prestado não só para a aviação nacional como também para a internacional.

Quanto à alegação de falha nos equipamentos a iniciativa é tentar mostrar nossa realidade. Muitos deles estão obsoletos. Há problemas dos mais variados em relação aos equipamentos que utilizamos, desde deficiências nas fonias – na comunicação – quanto nos softwares utilizados nos radares, que, em muitos momentos, geram “pistas” falsas (entenda-se pistas como sendo a forma que os aviões aparecem na tela do radar), mas que na verdade não existem, outras vezes duplicadas, que registram informações errôneas como a altitude, velocidade, matrícula da aeronave, quando não desaparecem da tela. Então, diante destes fatos nós nos sentimos responsáveis em revelar tais situações com o intuito de buscar soluções. É importante saber que o fatídico acidente só revelou o que estava acontecendo nos “bastidores”.

Eu posso falar que desde que ingressei na carreira de militar controlador de vôo, há alguns anos atrás, eu vejo tais reclamações que são registradas diariamente através de relatórios de perigo e no livro de ocorrências operacionais que cada órgão de tráfego aéreo possui. E é bem verdade que tais pendências quase nunca são sanadas da maneira correta.

A paralisação das atividades por cerca de cinco horas no dia 30 de março pode ser tomada como o pior episódio de crise. Na ocasião, o governo federal firmou um acordo com os controladores, mas recuou. Agora vocês estão sendo acusados por suspeita de insubordinação...

Realmente isto é fato. O importante nesta questão é saber o motivo da paralisação que deflagrou, sem dúvidas, o pior episódio até o momento. É interessante a população ficar ciente dos fatos que desencadearam tal paralisação. Nós fomos levados a essa situação a partir do momento que o governo não tomou nenhuma posição diante da resolução do Grupo de Trabalho Interministerial (GTI), criado pelo próprio governo para apontar soluções para a crise, agravado por uma sobrecarga de trabalho a um grupo que ainda tenta superar uma fase pós traumática ocasionada pelo o acidente da Gol e aos problemas nos equipamentos já mencionados, geraram uma insatisfação muito grande da nossa parte e não restaram, é claro que “vistas a sangue quente”, outra alternativa a não ser parar de trabalhar. É bom deixar bem claro que aviões que declararam urgências médicas, ou em emergência foram controlados até o destino.

Quanto ao “acordo”, pra não chamar de armação governamental, firmado com os controladores naquele momento surgiram os efeitos desejados. Trouxe à classe perspectivas de dias melhores. Entretanto, dois dias depois, tomamos um “tapa na cara” de primeira. Foi duro acordar e ver que o governo havia recuado e que, para não criar uma crise militar, o presidente mandou que novamente a aeronáutica reassumisse o controle da situação. Com tal posição a chefia retaliou das maneiras mais diretas possíveis, gerando para a mídia o termo insubordinação. E hoje, nós acreditamos ainda mais do que antes, que estamos vivendo um dos momentos mais tensos da crise. Em vários locais as chefias estão usufruindo do poder de uma maneira que gera ainda mais insatisfação dos controladores. Como exemplo, no CINDACTA I (Brasília) os controladores estão, neste mês, sujeitos a “dobrar” o seu turno de serviço de 8hs, caso haja falta ou atraso do companheiro que irá assumir o outro turno. Ou seja, estão “possibilitando”, para não dizer exigindo, que um controlador trabalhe 16hs em um único dia.

Na audiência na Câmara dos Deputados, 11/04, o Ministro da Defesa, Waldir Pires defendeu a transferência do controle do tráfego aéreo para a administração civil, alegando que em quase todos os países do mundo os militares já não atuam nesse setor. Já o comandante da Aeronáutica, brigadeiro Juniti Saito, afirmou que não é simples separar esse tipo de atividade e que o problema atual é a falta de controladores e não a militarização. Quem está com a razão?

É notório que o problema é de gestão, atualmente exercida pelo Comando da Aeronáutica, pois como explicar o ILS - Sistema que permite que uma aeronave pouse mesmo com a degradação das condições meteorológicas - do Aeroporto de Guarulhos ficar duas semanas esperando um vôo de aferição realizado por uma aeronave da FAB? Como explicar a pane de freqüências no Cindacta I –Brasília- no dia 05 de dezembro e após dois dias o Comando admitir que falta de técnicos para sanar a pane? Será que a crise está só na falta de controladores? Mesmo que fosse, ainda assim, seria um problema de gestão. Logo, a razão se torna mais próxima do Ministro Waldir Pires quando defende a transferência do tráfego aéreo a um órgão civil.
É evidente que a aeronáutica não quer perder a gestão do Sistema Tráfego Aéreo, pois este Sistema gera uma receita muito alta para ela. Sendo assim, a defesa por parte do Comandante da FAB da não desmilitarização estará sempre presente em todos os discursos.

Quais são as reivindicações dos controladores?

São as mesmas concluídas pelo GTI - Grupo de Trabalho Interministerial - ou seja, a desmilitarização, a regulamentação da profissão e sua carreira, criação de uma secretaria de aviação civil subordinada ao Ministério da Defesa. Como eu disse, a insatisfação começou quando não vimos nenhuma ação do governo perante as propostas do GTI.

A Agência Folha divulgou recentemente trechos de uma carta dirigida aos controladores de vôo, que teria sido escrita pelo presidente da Abcta, o sargento Wellington Rodrigues. A carta foi escrita dia 05/04, um dia após o pedido de perdão à sociedade pelo apagão da semana retrasada. Qual a intenção do pedido de perdão?

Essa é uma questão bastante complicada, porque, na verdade, entre os próprios controladores há divergências sobre o tal pedido de perdão. Alguns criticaram, outros apoiaram... Acho uma questão muito delicada para que possamos responder, só mesmo o sargento Wellington sabe o motivo.

Com os problemas técnicos que vieram à tona com a crise, você considera que voar hoje na Brasil é seguro?

É difícil chegar uma conclusão. Por um lado você tem um sistema degradado, por outro um controlador que ama o que faz e zeloso com as vidas que geralmente têm em suas mãos, porém humano, sujeito a falhas, limitado pela circunstâncias a qual é submetido. Mas eu tenho plena certeza de que ainda sim é seguro voar no Brasil tendo em vista a competência e o profissionalismo dos controladores de vôo.

O Comandante Juniti Saito afirmou que até o final do ano 500 controladores estarão aptos para exercer as funções de controladores de vôo. Isto procede?

Como já mencionado, a Aeronáutica vai tentar resistir ao máximo à desmilitarização, lançando na mídia informações que de certa maneira atraiam pessoas desinformadas. Obtendo apoio político e, obviamente, mais forças para resistir.

Para que um controlador esteja efetivamente homologado e capacitado para exercer de maneira eficaz o serviço em um órgão operacional como o CINDACTA (Brasília, Curitiba, Recife, Manaus) em sua posição Centro de Controle (ACC), onde são controlados a maior parte dos vôo no Brasil, são necessários no mínimo 3 anos. Em outros órgãos como Controle de Aproximação (APP) e Torre de Controle (TWR) este tempo varia de acordo com a localidade, entre 6 meses até 3 anos. Porém a grande deficiência de pessoal está justamente concentrada nas zonas de maior número de tráfego, pois o estresse excessivo faz com que diversos controladores deixem a profissão, troquem de função ou até mesmo fiquem afastados por problemas psicológicos. Estes, então, tornam-se os locais mais críticos de se trabalhar.

Outro detalhe interessante é que dentre estes 500 controladores estarão os profissionais recontratados. Diz-se, salvo engano, que serão 160 “novas” recontratações. Mas, veja se você encontra estampado nos noticiários, veículos à Aeronáutica, quantos são os controladores que estarão se aposentado este ano, ou por ventura deixando o seu cargo. É evidente que dentre esses 160, certamente, estarão aqueles que deixaram a Força Aérea, aposentados, neste início de ano.
Ou seja, 500 controladores em um ano é mais uma artimanha de marketing do que uma realidade promissora.

 

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