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15/06/07
O silêncio do indizível

Olhava para o papel e não sabia sobre o que escrever. Perdeu a inspiração e não sabia onde, nem quando. Suas palavras haviam sumido, vestiram-se de silêncio. Um silêncio ensurdecedor. Procurou debaixo da cama, nos bolsos, na bolsa. Não a encontrava. Diante dela o papel, em branco, virgem, a esperava. Contudo, suas mãos eram impotentes, não sabiam mais conduzir a caneta. Talvez tivesse perdido o ritmo, o compasso.

Sabia onde quando pontuar as frases, mas não havia frases. Estava presa no ponto inicial e não sabia mais como partir, deixar fluir. Diante dela uma página inteira, alva, pura, crua, esperando ser vestida de palavras. Mas essas não estavam mais ali. Calaram-se. Talvez estivessem adormecidas.

Ela queria falar da vida, do que seus olhos viam e absorviam. Era um mundo inteiro para ser escrito, descrito. Mas não sabia como. Suas mãos seguravam, impotentes, a caneta. Sentia o peso da obrigação. Sabia que aguardavam suas linhas, seus parágrafos, seus dizeres. Mas tudo era repetitivo. Tudo parecia jornal de ontem. Tudo que dissesse seria comentário inviável. E ela olhava mansamente o horizonte pensando em amanhãs.

No fundo estava descrente de suas palavras. Escrevia tanto, sempre, sobre o mesmo mundo que nunca mudava... Olhando a folha em branco, era acometida por uma dor inexprimível. Ela tinha sempre só palavras e eram poucas diante da imensidão do mundo inerte. O silêncio era quase que uma dor inexprimível.

O silêncio lhe dizia que a realidade não era feita dos sonhos que ela costurava com as palavras. No chão havia cacos dos sonhos e suas palavras pisavam descalças, sangrando a frustração de não serem nada além de palavras. Gota a gota, sangravam as crenças, uma a uma. Até esgotarem-se no silêncio do indizível.

Lá fora um mundo de absurdos.Absurdos que ela não sabia se estavam nos olhos dela ou no mundo. Porque ninguém parecia se importar... Lá fora um mundo que ela não sabia mais como descrever. Foi acumulando a realidade, a fatalidade de não saber mais o que fazer do papel em branco. Desencanto. Era o maior de todos os abismos...
Sonhava ainda com um mundo, que não sabia mais sonhar. Algo lhe sussurrava que não devia desistir de suas palavras, mas no momento, elas eram ausentes. Faltavam motivos pertinentes para que elas viessem à tona. Escondeu-se no silêncio da folha em branco. Pensou que, talvez, o não dizer, fosse uma forma de dizer. De ser. Escondeu-se na folha em branco, lá, bem onde o silêncio se traduzia numa dor inexprimível.


 

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Thaís Palhares é belorizontina de nascença. Palhares de pai. Fernandes de mãe. Thaís de comum acordo. Jornalista por opção e por convicção. Escritora por paixão. Viva, por isso, incansável. Escreve aqui todas as sextas-feiras. Fale com ela: thaisgalak@gmail.com

 

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