10/08/07
Certa vez, o poeta disse
que todas as cartas de amor são ridículas...
Mas que se não fossem ridículas, não
seria cartas de amor...
Nesse espaço que
me é permito criar, crio agora duas personagens,
com um tico de cada um de nós... Dois personagens
que são ridículos, pois escrevem cartas de
amor. São ridículos, pois ainda acreditam
que só o amor pode suavizar o caos do mundo,
e se lançaram no caos de amar...
Os exponho agora, remexendo
em suas correspondências, na loucura, como diria aquele
outro poeta: na loucura já perdoada.
Apresento-lhes nas letras
e palavras, as miudezas de André e Manoela. Vez ou
outra, nos permitirão nuances aqui, nessa coluna,
sob essa perspectiva.
André,
Mais uma vez o dia nasceu
e o sol se pôs e agora a cidade dorme e meus olhos
se acostumam com as olheiras profundas, mais uma marca que
você me deixou. Já não durmo, porque
não há com o que sonhar. Tornei-me sonâmbula
dos meus sonhos. Respeitei seu pedido e não te ligo,
o silêncio deixa claro que minha atitude foi consentida.
As horas se derretem num infinito
amargo de lembranças doces... Desde que você
chegou na minha vida eu acreditei que era possível
amar para sempre e você foi confirmando a ilusão.
Eu vivi dias de espera, de esperança, tinha um monte
de amor pra dar, provei os cinco sentidos, imaginei o futuro
e uma nova chance, comidinhas, bebidinhas, toques, cheiros,
e um amor de corpo, alma e coração. Fiquei
realmente feliz e plena, achei que era mesmo pra sempre,
mas você foi saindo de mim e, quando percebi, você
já não estava mais...
Tentando negar os fatos, blasfemei
que você era um fraco, um covarde, e tudo seria mais
fácil assim... Mas agora que estamos sós,
meu silêncio e eu, confesso que a cada dia que passa
acredito mais que você é uma pessoa forte e
não abre mão do que quer. É por isso
que você não volta. Você me concedeu
a ilusão de ser feliz por algum tempo; aliás,
nunca imaginei que pudesse ser tão feliz na vida.
Apesar da distância, me sentia próxima do seu
coração. Devagar, estou compreendendo que
você não vai mudar sua vida assim tão
completamente por minha causa.
Esta carta lhe parece injusta?
Impressão sua. Se parecer magoada, aí é
outra história. Mas o que isso importa? Seu silêncio
vai continuar imperando e você vai continuar levando
sua vida para cada vez mais longe de mim. Estou no vácuo
que eu mesma criei, tentando me agarrar na pontinha do balão
que já se esvaziou, e que nem era pra ser meu.
E me irrito quando constato
que, mesmo assim, quero te ver uma vez mais
E você
pede que eu me afaste e eu te digo que te amo e é
impossível querer te amar sem te querer pra mim.
Porque contra tudo o que eu desejo, minha fé irracional
ainda crê em nós.
Te espero. Espero que você
espere para que possamos esperar. Espero que você
desperte e se lembre dos meus olhos, do infinito e da porção
de coisas que não podem ficar pra trás. Por
quê? Porque eu te amo, mesmo que você não
tenha sabido me amar... Porque você me amou com verdade.
Nos olhos e na ingenuidade de uma criança que não
pode prever as dores do mundo. Mas eu devia saber, devia
mesmo saber que o seu amor não era pra mim. Porque
eu nunca seria boa o bastante. Mas você sabe que eu
seria uma grande mulher pra você e te esperaria sempre...
Vivo paralela à esperança
do eventual, das coincidências que sempre foram nossas
aliadas, e quem sabe numa dessas nossos olhares possam se
reencontrar?
Sou mesmo uma boba, como você dizia entre risos. Porque
eu sustento nossa relação sob o nada.
E não me espanta estar
sozinha, mas sim não te encontrar. Porque você
sempre foi melhor que eu, e eu não sei mais como
ser melhor. E eu aceito sem medo o infinito... E não
queria que no fim desse no mesmo. Não queria o seu
silêncio, a sua falta. A sua sobriedade. Queria o
seu melhor porre e a sua pior ressaca...
Amo-te tão profundamente
e a realidade me é agora tão rasa... Quero
nosso amor de volta, com direito a parar no tempo. Quero
a porta sem chave e a expectativa das ruas do presente.
Mesmo com alguma sujeira. Pode chover na memória,
porque ainda me parece possível o estado inexplicavelmente
de ser tua para nunca mais.
E eu termino mais uma vez minhas palavras que só
encontram o seu silêncio, traduzido em desprezo...
Leia mais:
03/08/07 -
Tenho
dó
___________________________________
Thaís
Palhares é
belorizontina de nascença. Palhares de pai. Fernandes
de mãe. Thaís de comum acordo. Jornalista
por opção e por convicção. Escritora
por paixão. Viva, por isso, incansável. Escreve
aqui todas as sextas-feiras. Fale com ela: thaisgalak@gmail.com
|