07/12//07
O mesmo enredo
Acreditar eu não acreditava,
mas tinha esperança. Dessas que brotam na gente sem
que a gente se dê conta ou possa fazer alguma coisa
contra. Esperança eu tinha,muita mesmo, mas não
acreditava. Era um sentimento irracional, sem bases sólidas
ou exemplos passados, só tinha esperança.
Digam o que quiser... Nasci
brasileira e fui feita com essa dose extra de esperança,
fé que não se justifica... E dessa vez, pensei
mesmo que pudesse ser diferente. Que depois da tempestade,
o sol fosse nascer diferente lá por aquelas bandas.
Pensei que o sol fosse nascer
e iluminar cada canto, cada história obscura. Tive
esperança, um fiozinho de esperança, que o
sol tirasse o cheiro de estragado, de coisa pobre que tem
os ares de lá. Assim, como roupa que cheira a mofo
e a gente põe no sol, sabe?
Pois é... E eu acho
que não fui a única. Pois essa história
deu pano pra manga e eu achei que fosse render alguma coisa.
Mas não foi dessa vez, mesmo que houvesse a tal da
esperança...
Mesmo com a pressão
da imprensa, da opinião pública, mesmo contra
todos os fatos expostos e documentos... Mesmo assim nada
foi feito e voltamos de onde nunca saímos...
Renan Calheiros foi absolvido
e saiu sorrindo. Os senadores falaram bonito e se esconderam
atrás do voto secreto. Tratam o caso agora como página
virada, coisa sem importância. Querem olhar pra frente...
Eu também, mas vou dar com a cara na porta e ver
sangrar a minha esperança de um País melhor...
E aí, aí sai
a notícia que expectativa de vida do povo brasileiro
aumentou. Viveremos, em média, até os setenta
e poucos anos... Mesmo sem expectativa de melhora, de mudança...
Vou envelhecer, ouvindo que somos o País do futuro.
Um futuro sem presente, sem perspectiva...
Vou envelhecer passando pelo
histórico momento da TV em alta definição,
a maior revolução de todos os tempos. A Era
digital. A maior revolução que não
revolucionou nada... Vou assistir na TV em HD, a mesma programação
sem conteúdo, com bundas rebolativas intercalando
escândalos políticos com o mesmo final. Estarei
sentada no sofá, apática, envelhecendo com
o meu fiozinho de esperança aleijado e pisoteado...
Vou envelhecer e morrer aos
setenta e poucos anos, vendo meus filhos passarem pela juventude
com sede de mudança, com a esperança verde
e amarela forte e infinita, e sentir um aperto no coração.
Vou lembrar que quis mudar o mundo e envelheci em frente
à minha TV de alta definição...
E essa esperança insistente,
com cheiro de pizza requentada continuará em mim,
contra todos os fatos... Essa esperança descrente
se fortificará cada vez que um escândalo vier
à tona e assistirá muitas vezes o mesmo desenrolar
da trama...
A amante na capa da playboy,
o senador com os bolsos cheios rindo sem nenhum arranhão,
os votantes fazendo-se de cegos, surdos e mudos, o povo
esperando, já esquecendo pelo que espera... Sempre
assim, como um romance barato, o mesmo enredo, o mesmo final
e a mesma esperança torta e sem razão.
Sem perspectivas, sem acreditar,
mas com um fiozinho cretino de uma esperança que
não se justifica...
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Thaís
Palhares é
belorizontina de nascença. Palhares de pai. Fernandes
de mãe. Thaís de comum acordo. Jornalista
por opção e por convicção. Escritora
por paixão. Viva, por isso, incansável. Escreve
aqui todas as sextas-feiras. Fale com ela: thaisgalak@gmail.com
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