
25/03/08
Sobre amor, progresso e solidão
Em meio a tanto progresso e
avanço tecnológico que vivemos hoje, é
interessante constatar como que do ponto de vista das relações
afetivas continuamos a ser conservadores e obsoletos. Vivemos
constantemente na premissa do amor romântico onde
o outro tem que nos servir constantemente, isto é,
o outro se torna um objeto que tem que fazer-me feliz e
fazer com que me sinta completo e desejado. Em meio a tanto
discurso de progresso o que se busca hoje não é
uma relação onde existe individualidade, respeito,
felicidade e o prazer de estar junto. Prevalece ainda a
relação de dependência em que um responsabiliza
o outro pela sua felicidade ou tragédia. O amor romântico
nos mantém presos e divididos. Ficar sozinho se torna
algo parecido com que se ficar doente, sinônimo de
infelicidade e derrota. Este processo de divisão
onde só posso ser feliz encontrando minha metade,
historicamente tem levado a mulher ao cárcere da
submissão. Ela abandona seus projetos, para se amalgamar
ao projeto masculino. Essa é a intenção
do amor romântico: o outro tem que saber o que não
sei e vice-versa. Uma idéia funcional pratica e trágica.
A idéia de hoje deveria ser parceria. Deveríamos
trocar o amor de necessidade, pelo amor de desejo, isto
é, eu gosto e desejo a companhia do outro, mas não
necessito o que é bem diferente. É interessante
constatar que com o avanço tecnológico, que
exige mais tempo individual, as pessoas paradoxalmente morrem
de medo de ficar sozinhas. Não aprendemos a conviver
bem com nós mesmos.
Não deveríamos mais nos sentir metades nem
fragmentados. Somos inteiros. O outro que se estabelece
o elo não é príncipe ou salvador de
coisa nenhuma. É apenas mais um companheiro de viagem.
Estamos na era da individualidade, porém nós
tornamos egoístas. É interessante dizer que
individualidade não tem nada a ver com egoísmo.
O egoísta sempre se “alimenta” da energia
do outro seja ela financeira ou moral.
Em tempos modernos, o amor deveria ter mais sentido, feição
e significado. Deveria unir pessoas inteiras e não
juntar metades. Esta nova relação só
é possível para aqueles que conseguirem trabalhar
sua individualidade. Quanto mais o sujeito conseguir trabalhar
sua individualidade mais estará preparado para um
encontro fundamental. Às vezes solidão é
boa, ficar sozinho não é algo que temos que
nós envergonharmos. Ao contrario da dignidade a pessoa.
Boas relações são bem parecidas com
ficar sozinho. O paradoxo da alteridade é esse: Estamos
unidos, porém separados. Ninguém exige nada
de ninguém e ambos crescem.
Com a globalização que deveria nos aproximar
mais, as relações continuam a ser de dominação
e concessões exageradas. Nosso modo de pensar, agir
e viver não serve de referencia para avaliar ninguém.
A idéia de alma gêmea nada mais é do
que a invenção do outro ao nosso gosto e prazer.
Deveríamos ficar sozinhos de vez em quando, para
construir um diálogo interno e descobrir nossa força
pessoal. Na solidão (ainda que indesejável
companheira), o individuo compreender que repouso e paz
só podem ser encontrados dentro dele mesmo e não
a partir do outro. Ao percebemos isto, nos tornamos mais
tolerantes e compreensivos quanto as diferenças respeitando
a maneira e o limite de cada um. Na contemporaneidade o
amor de duas pessoas inteiras seria bem mais interessante
e saudável, pois neste tipo de ligação,
há o aconchego, o prazer da companhia e o respeito
pelo ser amado.
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Samuel
Franco dos Santos é psicólogo, pós-graduando
em Teoria Psicanalítica Fale com
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