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Gesto "artístico" voltará a se repetir na Bienal CentroAmericana de Honduras.

 

16/04/08
Em nome do nome


As limitações parecem não fazer parte de um mundo onde a criatividade e a experimentação estão em jogo para celebrar a arte e afirmar a capacidade humana em simular os movimentos da natureza. Umberto Eco ao escrever sobre a forma da produção artística no período da Baixa Idade Média, destaca um ponto que trata a ars como ponto de partida para que o homem medievo conheça a sim próprio a partir do seu poder de "copiar" os movimentos fenômicos da natureza. Para Eco, o artista, o artesão, não é mero artífice de clonagem da criação voluntária que acontece no mundo natural. Ele é aquele que "imita" o movimento criativo da vida originando um novo reflexo vital reconfigurado pelos diversos ramos da arte. Criar é uma necessidade inerente à nossa capacidade cognitiva. E fazer arte também.

A conceituação destas criatividades e experimentação reajem diversificadamente como nossa própria forma de estar e pensar o mundo que nos rodeia. A arte medieval, como seu próprio tempo, era concreta, no sentido imediato do ser e estar. Retratava sua história, como quadrinhos gigantes de um tempo que estrangulou o arcaismo da arte rupestre. Sumcubiu o modo medieval de fazer arte, a comteporaneidade, advinda da evolução renascentista. Firmou-se hoje ou desequilibrou-se pela exagerada necessidade de se tornar inédito, polêmico, bombástico e cool.

Diferente do medievo, o homem neo-moderno não se espanta com novidades. É fatalista e arte o acompanha. Para subir no palco do conceito, o auto-denominado artista Guillermo Vargas Habacuc, em 2007 acolheu um cão abandonado de rua, amarrou-o em uma corda presa à parede de uma galeria de arte na Nicarágua e ali o deixou até a morte, lenta, de fome e sede. Durante vários dias o autor deste ato, juntamente com os visitantes da galeria, presenciou, passivo, a agonia do cão, até que, finalmente morreu, indiferente aos olhos de quem por ali passava. Tal ato foi, canonicamente dito como arte pela prestigiada Bienal Centroamericana de Arte, denominado "exaltação do maltrato" e de modo surreal e incompreensível, Guillermo foi convidado para repetir o gesto na Bienal deste ano em Honduras.

A intenção do autor é impactar certamente e apresentar o desprezo que se tem pelo outro, seja ele quem o for. Seja cão, gente, planta ou pedra. A indiferença social é uma verdade que não precisa ser dita pela arte ou pelo desperdício da criatividade humana. É um fato explicito e não subjetivo. Habacuc, num ímpeto desejo de tornar a arte um lugar da reflexão, apropria-se dos sentidos mais cruéis contra a vida, que fere, pálido e lucidamente, os príncipios excelentes dos fenômenos naturais, que por sua vez praticam atos involuntários num movimento de ação-reação dianta da sua própria sobrevivência cíclica. Fere o direito dos deveres do homem de não abondonar e não maltratar a vida. Na intervenção, Guillermo se esmera no fato das pessoas também se tornarem alheias à situação apresentada por ele. Não tornaram-se solidárias à vida de um cão sem dono. Diferente da natureza, a cognição humana canalizada para a arte pretende colocar o homem no lugar humano que deveria se encontrar, sem necessidades urgentes de abuso de criaturas vivas e inocentes em prol de uma cegueira social e permissiva, fruto de tantas perguntas.

Não há aqui partidarismo green peace ou vegan, apenas uma dúvida que surge diante do palco que não pode ficar vazio e da necessidade de canonização de tantas formas pseudo-artísticas em nome do nome e do gesto "artístico". Se o sofrimento de um cão não mobiliza pessoas a evitar a perda da vida, supostamente crianças amarradas ou senis abandonados também não o faria. Entretanto, o papel do artista é recriar a vida, conduzir o espectador à sua própria reflexão sobre a obra que interage com seu mundo. Não há de colocar a arte em pé de igualdade aos media mass a ponto de estrangularização da criatividade num ato desesperado onde pessoas mantêm a invisibilidade do outro em troca de coquetéis, cifras e flashs.

Contra o movimento, pode-se participar de uma petição para impedir o ato de Habacuc na Bienal de 2008. Para assinar, basta acessar:
http://www.petitiononline.com/13031953/petition.html

Para ver mais fotos:
[http://img505.imageshack.us/img505/1990/dscn8139vk6.jpg]
[http://img339.imageshack.us/img339/5848/dscn8146pu4.jpg]
[http://img259.imageshack.us/img259/5720/dscn8153yv8.jpg]
[http://img218.imageshack.us/img218/7240/navitividad1cq9.jpg]
[http://img218.imageshack.us/img218/7937/navitividad4so6.jpg]
[http://img218.imageshack.us/img218/5895/perritoho5.jpg]

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2007


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Rodrigo Saturnino é jornalista, mestrando em Ciências da Cultura / Comunicação e Cultura na Universidade de Lisboa e tem um blog: www.nossoopiodecadadia.blogspot.com. Fale com ele: rodrigo@obinoculo.com.br


   
 

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