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O mais interessante de “Rocky” é que ele não ganha a luta. A graça da coisa não está tanto na vitória, mas sim na beleza de se lutar como um bom lutador
 



08/08/07 -Quarta-feira

A beleza dentro dos ringues

Olá, amigos, é com muita honra e prazer que começo a escrever nesse espaço. Pensei muito se teria um tema fixo como política, cinema, música, futebol de botão, ou qualquer outra coisa para essa coluna. Acabei decidindo deixar isso em aberto, uma coisa mais anárquica e sincera. Espero que gostem e dêem algum feedback, nem que seja para falar que está horrível!
Vou estrear a coluna falando sobre as fortes e estranhas relações entre o boxe e o mundo da arte.

O boxe é um dos esportes que mais chama a atenção de escritores, cineastas, músicos e demais artistas. Dezenas de obras-primas foram produzidas sobre esse esporte, que visto de longe pode parecer apenas uma barbárie praticada por brutamontes acéfalos.

Mas muitos dizem que o boxe é uma das metáforas mais cruéis da vida. Um ringue, dois oponentes. A vitória e a derrota como possibilidades. Sem empate, sem prorrogação. Cada movimento pode levar a glória ou a derrocada. Os olhos da platéia seriam como os olhos da sociedade, que não perdoam nenhum movimento em falso.

Sendo o boxe uma representação da vida, a arte não poderia deixar de representá-lo. No cinema, é inevitável lembrar de Rocky Balboa. O personagem brucutu, porém meigo, é uma das figuras mais carismáticas da sétima arte. O primeiro filme da série tomou o mundo de assalto. Rocky, um capanga da periferia de Philadelphia e boxeador amador, era um sujeito solitário, sem cultura, sem estudos, sem perspectivas. Até que um dia, surge a oportunidade de sua vida. Encarar o invicto campeão mundial dos pesos pesados, que procurava algum lutador desconhecido para desafiar. As chances de vitória são perto de zero, mas Rocky Balboa aceita o desafio.

O mais interessante de “Rocky” é que ele não ganha a luta. A graça da coisa não está tanto na vitória, mas sim na beleza de se lutar como um bom lutador. Perdedores e vencedores são termos relativos, e não tão importantes, quando se tem certeza de que se lutou com honra.

Com uma abordagem mais profunda, há a obra prima, “Touro Indomável”, de Martin Scorcesse. O filme conta a história do bruto Jake La Mota (interpretado magistralmente por Robert De Niro). O boxeador lutava com o coração em um estilo completamente animalesco, tal qual um touro. Uma máquina de socos, que destroçava qualquer rosto a sua frente. Até na hora de perder, La Mota era como um touro teimoso, que mesmo ferido, se recusa a cair.

Ao contrário de Rocky, La Mota não era uma figura doce ou meiga. Em casa, refletia sua personalidade violenta, ao sentir um ciúme doentio de sua esposa. Como só conhecia a linguagem da brutalidade, não conseguia se relacionar com sua mulher de outro jeito. As cenas de agressão são fortíssimas e mostram que o anti-herói La Mota era também inseguro e covarde.

O filme também revela, sem maniqueísmo, os bastidores do esporte. Os acordos debaixo do pano, o dinheiro, as bolsas de apostas, a luta para entrar no peso, o álcool, e, o mais importante: mostra como a glória e a decadência andam perigosamente juntas. A filmagem em preto e branco, as atuações impecáveis de De Niro e Joe Pesci, e o jeito poético, e ao mesmo tempo, visceralmente violento, de se filmar as lutas, fazem desse filme um dos grandes clássicos do cinema.

Na literatura o esporte também é muito bem representado. Hemingway, por exemplo, era um exímio lutador de boxe, e lendo as suas obras, é possível traçar um paralelo com o esporte. Cada frase curta é como um jab. Cada parágrafo cortante é como um direto seco, que não perdoa o oponente; no caso o leitor.

Engraçado que Hemingway dava aula de boxe para grande parte da geração perdida - escritores estrangeiros que moravam em Paris, na década de 30 - inclusive para James Joyce. É no mínimo inusitado imaginar o cerebral escritor irlandês treinando boxe.

Há também outros exemplos, como o recém-lançado no Brasil, “Por um bife e outras histórias de boxeadores” de Jack London, outro escritor lutador. E “Garota de Ouro”, que é na verdade uma seleção de contos de F.X. Toole sobre o mundo do boxe. O filme – ganhador do Oscar de 2005 – é uma mistura de vários desses contos. Para quem gostou do filme, a leitura do livro é obrigatória, pois o livro se aprofunda ainda mais nos personagens e há algumas histórias geniais sobre o mundo da luta que não estão no filme.
Na música também há canções excelentes sobre o tema, como “Boxers” de Morrissey, que canta a dor de um boxeador que perde na sua cidade natal e se vê solitário, decadente, e sentindo uma dor física imensurável. No Brasil, o cantor e boêmio Nelson Gonçalves começou sua vida como boxeador, tendo sido inclusive campeão paulista dos pesos médios.

Mesmo que você não esteja disposto a subir em um ringue e correr o risco de quebrar o seu nariz, ou de ganhar um, nada bonito, olho roxo, não perca a chance de entrar em contato com essas obras, que sem dúvida alguma vão nocautear muitos preconceitos.



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Renato Rios Neto é jornalista e já foi vocalista da banda Carahter, que teve um CD lançado, mais algumas músicas gravadas por aí e fez turnês pelo Brasil, América do Sul e Europa. Ele se considera um boxeador frustrado e também apaixonado por literatura.
Fale com ele: xrenato82x@gmail.com

 

   
 

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