
07/04/08
A informação
na era de sua
reprodutibilidade técnica
A chamada “primeira revolução
tecnológica” se deu no início do século
XVI quando Johannes Gutenberg desenvolveu a prensa de tipos
móveis, possibilitando a impressão de páginas
de livros em série e, conseqüentemente, o acúmulo
e divulgação de informações
de forma mais eficiente. Naquela época, só
o que já era consagrado (pertencente ao cânone
literário) era impresso, por motivos óbvios
– o processo de arranjar e dispor letra por letra,
página a página custava muito tempo e mão-de-obra,
que já significavam, a seu modo, dinheiro. O controle
da divulgação da informação
tornou seu processo de expansão mais lento e dirigido;
e não se pode dizer que ele tenha sido verdadeiramente
popularizado com a evolução da tecnologia
dos cinco séculos seguintes, uma vez que publicar
sem se estar vinculado a uma instituição ainda
hoje custa geralmente mais do que as vendas cobrem e do
que a maioria dos autores pode pagar.
Em resposta a essa demanda por um espaço alternativo
de expressão surgiram em todas as épocas publicações
não-oficiais de todos os gêneros e em diversos
formatos. No entanto talvez nenhuma tenha podido igualar
o poder disseminação que a internet proporciona
após apenas poucas décadas de utilização
pública. Seu formato pode ser encarado como uma extensão
da afirmação de Walter Benjamin (BENJAMIN,
Walter. A obra de arte na era de sua reprodutibilidade
técnica. In: Magia e técnica, arte e
política.), de que a progressão da técnica
possibilitaria a expansão cada vez mais rápida
da informação: “Conhecemos as gigantescas
transformações provocadas pela imprensa –
a reprodução técnica da escrita. Mas
a imprensa representa apenas um caso especial, embora de
importância decisiva, de um processo histórico
mais amplo. (...) A litografia ainda estava em seus primórdios
quando foi ultrapassada pela fotografia. Pela primeira vez
no processo de reprodução de imagem, a mão
foi liberada das responsabilidades artísticas mais
importantes, que agora cabiam unicamente ao olho. Como o
olho apreende mais depressa do que a mão desenha,
o processo de reprodução das imagens experimentou
tal aceleração que começou a situar-se
no mesmo nível que a palavra oral. Se o jornal ilustrado
estava contido virtualmente na litografia, o cinema falado
estava contido virtualmente na fotografia”.
Através do computador, diferentes formatos se fundem,
sendo até certo ponto escolhidos e controlados pelo
próprio usuário de forma ativa, diferentemente
do cinema ou da televisão. O mesmo se dá com
o conteúdo: na rede mundial a oficialidade convive
com milhares de versões e reproduções
não-oficiais. Algumas chegam a se tornar oficiais
ao se tornaram mais populares. O que mostra existir, ainda
que pouca, alguma qualidade na imensa quantidade de conteúdo
livremente produzido. E também que, mesmo se tratando
de uma cópia, paródia ou pastiche de outro
conteúdo pré-existente, o elemento espaço-temporal
tomado por Benjamin como sendo vital para definir a autenticidade
não se aplica a este universo virtual:
“Mesmo na reprodução mais perfeita,
um elemento está ausente: o aqui e agora da obra
de arte, sua existência única, no lugar em
que ela se encontra. (...) O aqui e agora do original constitui
o conteúdo da sua autenticidade, e nela se enraíza
uma tradição que identifica esse objeto, até
os nossos dias, como sendo aquele objeto, sempre igual e
idêntico a si mesmo. A esfera da autenticidade, como
um todo, escapa à reprodutibilidade técnica;
e naturalmente não apenas à técnica.”
Respeitada essa regra no que tange o mundo real (não-virtual),
o mais que há na rede com relação à
reprodutibilidade são violações de
direitos autorais, nocivas ao patrimônio (muito mais
ao financeiro que ao patrimônio cultural, embora seja
o primeiro, infelizmente, que “tolera” e subsidia
o segundo). Mas mesmo tais violações não
são fruto exclusivo do ambiente virtual, e sim reflexos
que a rede produz da complexa realidade social em que vivemos,
de seus anseios e receios, problemas e tensões, de
sua efervescência e pluralidade.
Em todo caso, com cada vez mais bagagem para carregar, talvez
estejamos mais longe de reinventar a roda, sob a sombra
da reprodutibilidade e vez ou outra ofuscados pela luz da
criatividade.
Leia
também
31/03/08-
Aqui
se faz, assim se paga
17/03/08-
Carne
e ossos dos deuses
26/02/08
- Sobre
a língua portuguesa brasileira
12/02/08
- Um
Momo sem trono
15/01/08
- Abaixo
o seguro!
08/01/08
- A
diferença entre trabalho e emprego
2007
_________________________________________________
Rafael Silveira
nasceu em Belo Horizonte em 1984 e vem vivenciando apaixonadamente
o processo infinito de aprender a escrever desde os seis
anos de idade. Não tem tempo para nada do que gosta,
só para o que ama. Aí estão incluídos,
além da literatura, música, pintura e cinema
(como espectador). Cursa Letras na UFMG desde 2004. Editou
seu "Pretérito Imperfeito", reunião
de poemas, em 2005. Fale com ele: rafael1silver@gmail.com
|