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Como no filme do austríaco Fritz Lang, Metropolis (1926), o monstro “Moloch”, constituídos de máquinas, após saciar sua fome por vidas, volta ao sono inquieto característico da sociedade moderna. Um novo dia nasce, como no início de Berlin – Sinfonia da cidade grande, de Walter Ruttmann, (feito em 1927, dois anos antes do famoso crack da bolsa de Nova Iorque que arrastou o mundo para a depressão econômica), o ritmo é aos poucos retomado.

 

 Metropolis, Fritz Lang (1926)
 

03/10/08
Sinfonia da metrópole

Chove. Nenhuma chuva cai. Caem pedras de gelo que logo se misturam ao vidro, de janelas, portas, pára-brisas, retrovisores, etc. É o mais próximo que já devemos ter chegado de neve em Belo Horizonte. Mas o país já pode se gabar de alguns terremotos, muitas queimadas, ciclones, tempestades – só faltavam vulcões. De qualquer forma o calor do sol já basta. O difícil é que nos trópicos não temos estrutura para um friozinho que seja - temperaturas abaixo de 10º já emperram os mecanismos básicos de uma cidade brasileira comum.

Senti-me reposto ao século XIX quando uma tempestade causou um corte de energia no bairro. Com direito a jantar à luz de velas, livros e... bom, mais nada. O telefone, que precisa de eletricidade para funcionar, também nanou. Terminei o livro que estava lendo sob a luz da vela. Depois comecei a escrever este texto e outras coisas à mão com grande dificuldade, não porque me faltassem idéias, mas sim por estar tão acostumado a digitar ao invés de propriamente escrever. Logo surgiu o instinto da melhor coisa para se fazer quando falta a luz, desde os primórdios: dormir.

Baseamos boa parte de nossa vida em dispositivos movidos a eletricidade. Desde bombas de combustível que contabilizam os litros de gasolina até elevadores e aparelhos hospitalares. Quantas vidas e quantos milhões não se perderiam caso o mundo fosse “desligado” por uma semana? Já após poucas horas de abstinência à energia elétrica comecei a me sentir incomodado, sem poder tomar banho nem terminar minhas tarefas.

No entanto o aprendizado de uma dura lição através de uma futura crise energética parece inevitável. Não dá para entender por que soa como ficção que a já precária estrutura de nossa sociedade possa entrar em colapso através de uma catástrofe climática, por exemplo. Catástrofes econômicas repercutem e são levadas muito mais a sério, em parte por seu maior imediatismo, mas principalmente pela relação doentia que nossa cultura desenvolveu com seus bens de consumo. Erich Fromm explicitava já há algum tempo essa relação de forma detalhada em seu livro "Do ter ao ser", preconizando os comportamentos da “Era do automóvel”. Infelizmente a conclusão a que ele chega não se compara com a profundidade do caminho percorrido: seria preciso modificar toda a nossa configuração social e estrutura socioeconômica para sermos mais justos, mais humanos, mais felizes e pacíficos. Isso não se dará de forma pacífica – se é que um dia realmente chegará a acontecer – por vários motivos: o primeiro e mais fundamental deles é o que as experiências socialistas mostram – a competição dá motivação às pessoas e regula a eficiência dos mecanismos de produção. A disciplina é menos natural e menos intensa se comparada ao ímpeto da destrutividade e competitividade humana. O segundo é que nossa aversão à responsabilidade nos torna dependentes de figuras que concentrem deveres e, conseqüentemente, poderes e dinheiro. Seguimos plantando vento, em parte por uma tendência natural, que Kant julgava ser nossa culpa. Em parte porque até hoje a tempestade costuma passar.

Como no filme do austríaco Fritz Lang, Metropolis (1926), o monstro “Moloch”, constituído de máquinas, após saciar sua fome por vidas, volta ao sono inquieto característico da sociedade moderna. Um novo dia nasce, como no início de Berlin – Sinfonia da cidade grande, de Walter Ruttmann, (feito em 1927, dois anos antes do famoso crack da bolsa de Nova Iorque que arrastou o mundo para a depressão econômica), o ritmo é aos poucos retomado. Os capôs amassados e pára-brisas quebrados são lentamente trocados por novos. Os destroços são vasculhados, removidos, reaproveitados. Os bancos falidos são comprados por investidores do Oriente.

Ao soar dos despertadores, estamos certos de que um novo dia nasce, apesar do cansaço.

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2007


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Rafael Silveira nasceu em Belo Horizonte em 1984 e vem vivenciando apaixonadamente o processo infinito de aprender a escrever desde os seis anos de idade. Não tem tempo para nada do que gosta, só para o que ama. Aí estão incluídos, além da literatura, música, pintura e cinema (como espectador). Cursa Letras na UFMG desde 2004. Editou seu "Pretérito Imperfeito", reunião de poemas, em 2005. Fale com ele: rafael1silver@gmail.com

   
 

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