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24/01/08
Qual a sua orgia?
A história de Bernardo,
o menino que nasceu da orgia, cresceu e hoje vive de fantasia
Bernardo nasceu de uma suruba.
Ele não sabe.
Sua mãe, Clara, branca
como leite e cristã como Maria, um dia, ao beber
o vinho do Padre, entrou em uma festa organizada pelos coroinhas.
Eram 4. Clara, na festa foi centro. Foi copo, prato. Foi
mesa, cadeira. Comida. Seu corpo era de todos, sem distinção.
No altar, trepou aos olhos. Enquanto fudia, observava o
teto, observava os peitos, o chão. Gemeu. Gritou.
Gozou. Como nunca antes. Foi irônica perante a vida.
Era de 4.
O dia em que seus pais descobriram
que estava grávida ela culpou Jesus. Jesus era um
dos quatro meninos que estavam na pequena orgia.
- Jesus, espero um filho seu!
- Como sabe que é meu?
- Sabendo, mulher sabe dessas
coisas. Vamos lá em casa, que já contei tudo
para minha família.
- Contou da orgia?
- Não, contei do nosso
namoro, que já tem um ano.
- Que namoro?
- Se não assumir, meu
pai te mata.
Assim, Jesus assumiu Clara
e Bernardo. Mas Bernardo não era filho de Jesus.
Bernardo era Junior. Bernardo vinha de outro Bernardo. O
que foi cadeira enquanto Clara era mesa. Bernardo não
sabe disso, nem Bernardo.
Bernardo cresceu. Cresceu e
um dia participou de uma orgia pela primeira vez. Maior.
Muito maior! Via-se pernas, via-se braços. Bucetas
e pintos. Tudo ali, em 20 metros quadrados de quadrado.
Dessa vez não tinha santos, nem jesus. Bernardo foi
mesa, foi cadeira e abajur. Bernardo gritava. Dia inteiro.
Gozo inteiro.
Bernardo cheio, Bernardo Vazio.
Bernardo não gerou junior,
estava protegido, protegido e podia ser quem queria, de
quem quisesse. A orgia era sua fantasia. Levou a orgia para
a vida. Levou a vida para a orgia.
Trabalha em um sex shop, feliz
no meio de coisas de plástico. Artificíais.
Filmes, cremes, chicotes. O que mais gosta em seu emprego
são as senhoras, santas como mãe, que entram
no sex shop e lhe pedem dicas.
“Brotinho, me dá
uma ajudinha aqui. Que fantasia você acha que pode
salvar meu casamento?”
Fantasia, Bernardo gosta de
todas. Vive nas fantasias. Vive do Carnaval diário
dos desconhecidos. Sua vida é isso. “Batman!”
“Batmam, minha senhora,
só ele pode salvar seu casamento!”
Bernardo. Fantasiado de orgia.
A fantasia faz parte da vida
de Bernardo, a vida de Bernardo faz parte da orgia maior.
Algum limite entre sexo e vida?
Entre vida e orgia? Qual a sua fantasia? Qual a sua orgia?
Qual o seu Jesus?
Qual é seu qual?
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Marcelo Valadares é
jornalista com sérias pretensões de se tornar
escritor, poeta, professor universitário, crítico
de arte, cineasta, prêmio Nobel da paz, pedinte, astronauta,
músico, cantor de Fado, dançarino de Tango,
mestre de Bateria e Neo-boêmio. Escreve para O binóculo
todas as quintas. Fale com ele: marcelo_valadares@hotmail.com
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