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Passei a questionar o papel da fotografia, das máquinas de fotografar e dos japoneses. Pensei também em uma solução para o problema de estar em um lugar novo sem uma máquina de fotografar. Minhas conclusões, lógico, não podem ser levadas a sério.

 

08/11/07
A máquina

Um texto louco sobre japonês, poesia, fotografia e uma senhora

Tive um momento importante na vida nesse último mês. Perdi minha máquina de fotografar. Não que eu seja materialista a ponto de pensar que esse evento vai mudar para toda eternidade a curta eternidade da minha vida. Mas, perder uma máquina de fotografar tem seu lado positivo e marcante.

Um dia, de ressaca, sentado em um café, resolvi apreciar a paisagem. Entrei em um mundo meu, apreciei e curti tanto, que quando me levantei, esqueci a pobre coitada em cima da mesa. Fui embora sem olhar para trás. Só fui lembrar que tinha um objeto parecido com uma máquina 3 dias depois, quando o tal do café já estava a centenas de quilômetros de mim.

A culpa e questionamentos por ter a deixado invadiram minha cabeça por 2 minutos, na verdade, mais pelas fotos que estavam nela, do que pela própria. Pensei na unicidade daquelas imagens para mim. 55 fotos únicas. Família, crianças brincando em um lugar que talvez eu demore a voltar... Pronto, essas foram as questões que acabaram logo, pois, o fato de não poder fotografar tomou conta. “Como eu vou registrar tudo que eu tô vivendo?” Isso também durou pouco, o tempo da pergunta. Logo, meu arrependimento por perder a máquina durou menos de 3 minutos e se considerarmos os 3 dias em que a existência da máquina foi apagada da minha cabeça, esses 3 minutos são insignificantes.

Mas, enfim, depois desse acontecimento passei a questionar o papel da fotografia, das máquinas de fotografar e dos japoneses. Pensei também em uma solução para o problema de estar em um lugar novo sem uma máquina de fotografar. Minhas conclusões, lógico, não podem ser levadas a sério, mas são as seguintes:

Sobre a fotografia: O maior brochante da história. Quase uma mãe batendo na porta perto do orgasmo, sabe como é? Enfim, imagina como seria muito mais surpreendente chegar a Paris sem nunca ter visto nada da cidade? E no Rio então, se deparar com a Baia de Guanabara pela primeira vez, sem nunca ter se quer visto nada a respeito. Seria a sensação de um descobridor. A foto tira essa possibilidade de desbravador.

Sobre a máquina de fotografar: Ela rouba os momentos. Você pensa: “Vou selecionar essa imagem e levá-la para o futuro”. Mas para fazer isso, você acaba quebrando o clima do momento. “Ei, ei, olha a foto”, ou então, caso queira uma imagem sem pose, você não participa do momento, nem entra para a eternidade, pois você é quem está lá batendo a foto. “Tira esse dedo da boca, menino!”.

Sobre os Japoneses: Como eles viajam! Tenho que aprender mais sobre eles, cheguei a essa conclusão, pois tive certeza de que eles já nascem com uma máquina de última geração acoplada a mão, como se fosse um prolongamento do dedo indicador. Uma evolução! Cheguei a conclusão, também, de que eles estão dominando o mundo pelos pontos turísticos. Quando for a uma cidade, em qualquer parte do mundo, pode saber, que no ponto túristico vai ter um japonês.

Depois de perder minha máquina, comecei a andar com um caderninho, no bolso. Inventei de escrever poesias sobre o que quero guardar. Foi a solução. Não que eu seja um poeta, (vou repetir isso mais abaixo para deixar bem claro), tem coisa que é tão ruim que não mostro nem para meus melhores amigos, mas ruim ou bom, sempre que leio lembro da cena em que me inspirei. Outro dia, por exemplo, estava em um posto de saúde e vi uma senhora, muito velhinha mesmo, dessas que dão vontade de apertar. Quis guardá-la na memória. E escrevi:

A velhice é uma poesia.

Silênciosa.

Passos rasteiros...

Casaco de lã.

Não sei se para quem lê, é tão bonito como é para mim. Pois ao ler, tenho a imagem exata da velhinha, com seu casaco de lã, passos rasteiros em direção a médica, linda, cheia e vazia de vida.

Fico imaginando se naquele momento estivesse com uma máquina. Não sou fotógrafo, como não sou poeta. Escolheria a máquina ao invés da caneta. Penso que a imagem seria mais fácil e se tornaria, com o tempo, banal. Poderia estar entre milhares de outras fotografias digitalizadas. Não guardaria essa senhora da mesma forma.

Enfim, ao mundo das imagens...



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Marcelo Valadares
é jornalista com sérias pretensões de se tornar escritor, poeta, professor universitário, crítico de arte, cineasta, prêmio Nobel da paz, pedinte, astronauta, músico, cantor de Fado, dançarino de Tango, mestre de Bateria e Neo-boêmio. Escreve para O binóculo todas as quintas. Fale com ele: marcelo_valadares@hotmail.com




   
 

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