
03//12/07
Bom Dia, Senhor Courbet!
Pinte o que você
vê. Este poderia ser um conselho de Gustave
Courbet a seus alunos, se ele os tivesse. Ter alunos é
dizer a alguém o que fazer, o que pintar, até
como pensar. Parece ser esse o pensamento de Courbet, que
preferia deixar as pessoas livres para agirem como lhes
conviessem.
A velha relação
comercial entre mecenas e artista pode ter começado
a mudar ali. Não é a toa que, no quadro Bom
Dia, Senhor Courbet, o próprio pintor se retrata
como um ilustre visitante nas terras de seu mecenas, Bruyas,
que lhe presta uma reverência. Este narcisismo do
artista é uma característica muito evidente
em sua obra, podendo também ser observado em outros
de seus trabalhos, como no auto-retrato de aproximadamente
21 metros quadrados intitulado O Ateliê do Pintor.
Para a sociedade, Courbet
podia ser tido como um indivíduo marginal, que gostava
de chocar e desafiar convenções e tendências,
e ele mesmo se considerava assim. Mas marginal, para ele,
era algo superior, diferente do usual, e usava seu narcisismo
para reafirmar esse status, colocando-se em destaque em
eventos, discussões e até em seus quadros.
O sistema de encomendas começou a mudar aí,
já que seu mecenas não lhe dizia o que pintar,
mas vendia o que já estava pronto.
Na carta endereçada
ao ministro das Belas Artes de Napoleão III, usurpador
do poder na França, ele recusa uma condecoração
que recebeu, caso notável de alguém que mantém
sua honra e dignidade. Tenho cinqüenta anos e
sempre vivi livre. Quando morrer, quero que digam de mim:
aquele nunca pertenceu a nenhuma escola, a nenhuma igreja,
a nenhuma instituição, a nenhuma academia,
sobretudo a nenhum regime, a não ser o regime da
liberdade, afirmou, reforçando sua posição
de homem livre que se negava a ter suas ações
ditadas por outrem.
Jorge Coli, em sua análise
sobre o quadro que dá nome a este texto, lembra que
o crítico Proudhon, amigo bem próximo a Courbet,
atribuía uma militância social à obra
do artista. Mas existe, aí, um equívoco: o
próprio Courbet assume que não tinha essa
preocupação. O quadro O Retorno da Conferência,
por exemplo, que trazia padres bêbados saindo de um
almoço regado a vinho, visava apenas causar escândalo,
e conseguiu.
Se há uma pessoa humilde
ou uma situação que indique pobreza ou injustiça
em seus quadros, é apenas porque Courbet via isso
e era sua filosofia retratar o que estava perto de si, em seu
mundo. Ele vivia e trabalhava seguindo sua própria
ética, que desenvolveu e à qual era fiel.
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Marcelo Seabra é jornalista
e pós-graduado em História da Cultura e da
Arte. Tem como objetivo tentar sempre manter alta sua média
de filmes assistidos, músicas escutadas e livros
lidos. Para falar com ele escreva para:
mseabra@gmail.com
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