
17/12/07
Sexo pós-colonial
Portugal, Lisboa, Casino de
Lisboa. A camisa do sujeito dizia: Eu sou a favor
da imigração e trazia um desenho de
dois corpos femininos nus segurando em um mastro (aquele
cano de metal que encontramos em palcos de strip, utilizado
pelas meninas em suas performances). Sim, a estampa de sua
camisa dava a entender a afirmação de que
as imigrantes são todas putas.
De fato as casas noturnas de
venda de ilusões, fantasias, e corpos femininos para
os machos lusitanos estão cheias de ucranianas, polonesas,
romenas e, em maior número, brasileiras. Um dado
interessante é que quase não encontramos africanas
neste ramo e eu me pergunto se esse fenômeno se dá
pelo fato da pele negra não estar ao gosto dos tugas
a preferência pelas branquinhas é bastante
explícita aqui, diferentemente do racismo velado
que há no Brasil ou se existe alguma resistência
maior por parte das descendentes da escravidão colonial
em se entregarem ao mercado do prazer sexual. É bem
mais fácil encontrá-las por detrás
dos balcões das numerosas redes multinacionais de
fast-food onde trabalham 12 horas por dia pelo miserável
salário recusado pela mão de obra européia,
enquanto hippies nórdicos mal vestidos enchem o chapéu
de euros com suas bonitas e variadas performances circences
nos locais mais turísticos da cidade.
E enquanto os negros
trabalham e os nórdicos fazem arte - constatação
do Rodrigo, nosso querido editor que se aventura comigo
aqui nessa terra estrangeira -, os portugueses lotam os
clubes eróticos e pagam para ter a companhia das
sensuais imigrantes. E a coisa faz um certo sentido quando
me lembro de que que na noite lisboeta - na noite legítima
e autorizada, onde não há a venda de prazeres
- a gente quase não vê pessoas se beijando,
casais de mão dada e meninos em conversas mais, digamos,
quente com meninas (digo meninas e meninos porque o caso
dos homossexuais talvez seja um pouco diferente). As pessoas
são meio travadas e o processo de sedução
é longo e burocrático. Vários nativos
já me explicaram que tudo funciona seguindo certas
regras imprescindíveis: troca-se olhares durante
muitas noites com a rapariga, depois aproximam-se e conversam,
depois trocam telefones e só daí algum tempo
é que se encontram para tomar um café. Do
primeiro olhar ao primeiro beijo leva-se uma eternidade.
E o sexo? Bom, isso parece não ser muito usual por
aqui, já que na maior parte do tempo estão
todos a ver navios preocupados com as estratégias
do joguinho amoroso. Minto, pratica-se muito sexo sim. O
sexo escondido, o sexo comprado, o sexo com as putas imigrantes.
Bom pra estas porque, dessa forma, nunca irá faltar
clientela. Ruim para certas portuguesas recatadas que gastam
seu dinheiro em roupas caras nos maiores shoppings da Europa
Lisboa é a terra dos grandes shoppings
na esperança de, quem sabe um dia, poderem as tirar
de graça para seus gajos enrustidos.
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Lira Turrer é
jornalista e escritora. Apaixonada pela literatura e inspirada
pelos fatos corriqueiros que permeiam a comédia do
cotidiano. Escreve aqui todas as segundas. Fale com ela:
liratd@yahoo.com.br
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