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Superficialidade: essa foi a palavra usada por Gustavo Spolidoro ao se definir no debate acontecido na Mostra de Cinema de Tiradentes: “bah, sou uma pessoa superficial”, assume o gaúcho. E podemos realmente notar essa superficialidade ao assistir Ainda orangotangos, primeiro longa do cineasta.

 

26/01/08
Ainda Orangotangos

João Paulo Teixeira
de Tiradentes Especial para O Binóculo

Superficialidade: essa foi a palavra usada por Gustavo Spolidoro ao se definir no debate acontecido na Mostra de Cinema de Tiradentes: “bah, sou uma pessoa superficial”, assume o gaúcho. E podemos realmente notar essa superficialidade ao assistir Ainda orangotangos, primeiro longa do cineasta. Não que esteja criticando ou julgando isso, quem sou eu para tal. Num país em que temos nos ídolos figuras como Ivete Sangalo, Zezé de Camargo e Luciano, Faustão ou jogadores de futebol, não se pode cobrar muito uma consciência crítica. Além disso, indo mais a fundo, como cobrar senso crítico de uma pessoa que acorda às cinco horas da manhã, leva duas horas para chegar ao serviço, trabalha durante oito, dez horas, só parando para comer a marmita já não tão quente contrastando com um sol torrencial, na volta enfrenta um trânsito ferrenho em um ônibus lotado e, ainda por cima, em pé? O usual é que ele chegue em casa e vá realmente assistir programas que não alimente o exercício crítico. (vou já avisando que esse não é o caso para a superficialidade assumida por Spolidoro). Entretanto, na minha opinião, muito pior do que isso são intelectuais ou pseudo-intelectuais que criticam arduamente essa superficialidade em textos ou artigos acadêmicos, vivem num mundinho só deles, quase como uma seita, e não contribuem em nada para o crescimento intelectual da sociedade.

Adaptado do livro homônimo de Paulo Scott, Spolidoro realiza um filme de 81 minutos num único plano seqüência, mostrando o dia de personagens diversos em Porto Alegre. Pelo fato do livro ser de contos independentes, em que um não tem ligação com outro, o diretor também não consegue essa ligação entre os personagens do filme. E dessa maneira o longa se torna inúmeros curtas, uns melhores, outros piores.

Gustavo inicia o filme com um casal de japoneses no metrô e a todo o momento o expectador imagina que esse japonês terá alguma ligação com os outros personagens do filme, que eles, por algum motivo, tenham ligação. O que não acontece. E assim surge o garoto colorado, o Papai Noel, a mulher nua, o casal que toma perfume....... Mais do que reticências.

E nessa “coisa” de vários curtas-metragens, destaque para o sonho/pesadelo em que uma mulher nua se depara com inúmeros pombos pela casa. Ali, mesmo sem o corte, existe essa impressão, afinal Spolidoro consegue sair dessa realidade aparente apresentada até então no filme, que vai contra a teoria do crítico André Bazin em que afirma que o uso do plano seqüência nos remete mais a realidade, e submete ao surrealismo. E com um ajuste na fotografia na pós-produção, cores ainda mais fortes, um áudio propositalmente exagerado e um jogo de atuação, Spolidoro faz deste a “cena” forte do filme.

Spolidoro, já acostumado na realização de curtas em plano seqüência, faz uso desse artifício pela primeira vez em longa metragem. Entretanto, a obsessão por esse artifício se torna apenas um exercício em Ainda orangotangos. Um exercício bastante complicado, há de se dizer, que demanda bastante agilidade da parte técnica, principalmente câmera e operador de boom, e atenção para produção. E nessa parte o longa vai bem, afinal, foram pouquíssimos momentos em que transeuntes olham para a câmera e nenhuma vez se tem o microfone em quadro.

A passagem de tempo também é bem resolvida por Spolidoro. No ônibus, em aspecto de obrigação, afinal há necessidade realmente do deslocamento do veículo, pois não há cortes no filme, o diretor “encaixa” uma conversa entre duas mulheres sobre a origem do “tri” em Porto Alegre e teorias sobre Papai Noel colorado. Conversas sem propósito algum e que nos remete a Tarantino, por exemplo, que usa muito desse tipo de diálogo em sua filmografia. Além disso, ainda na passagem de tempo, o diretor apresenta de forma singela e nada forçado o horário, seja no momento em que o garoto colorado compra um relógio, seja no quarto dos namorados ou quando o velhinho se encontra com o jovem professor de canto.

Ainda orangotangos tem no título forte crítica a sociedade, nos remetendo a barbárie usual dos primatas. Todos os personagens são mal resolvidos e não dão conta dos seus problemas pelos métodos, digamos, leais. E, dessa maneira, tentam resolvê-los por conta própria e de maneira underground, deixando que todo crescimento crítico, intelectual, harmônico desenvolvido com os anos sejam esquecidos. O filme de Spolidoro há aspectos positivos e outros não tão bons assim e vale ser assistido principalmente pelo exercício.

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João Paulo Teixeira é jornalista, pós graduando em “História da Cultura e Arte”. Tendo estudado na Escola Livre de Cinema, participou de inúmeros filmes como continuísta. Acredita que a continuidade é responsável direta pelo olhar mais crítico para o fazer e analisar obras cinematográficas. Escreve mensalmente para a Coluna Retalhos Culturais. Contato: jpteixeiras@yahoo.com.br


   
 

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