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Krzystof Kieslowski nunca gostou de seus próprios filmes e considerava a sétima arte como uma profissão como outra qualquer.

 

11/03/08
Um cineasta que não gostava de cinema

Em 1995, Krzystof Kieslowski faleceu após ter produzido mais de duas dúzias de filmes. Com a Trilogia das Cores (Trois Couleurs) vieram algumas indicações, prêmios importantes e a consagração como cineasta. A trinca, baseada na máxima da Revolução Francesa “liberdade, igualdade e fraternidade”, elevou Kieslowski ao patamar dos grandes diretores europeus das últimas décadas, consagrando também a sua capacidade de modelagem de conceitos através da discussão de ideais generalistas a partir dos conflitos morais da nossa sociedade contemporânea.

A opção estética em privilegiar cada um dos três filmes com uma cor da bandeira francesa (No Brasil, A liberdade é azul, A igualdade é branca, A fraternidade é vermelha) permitiu a criação de uma nova personagem; ora se superpondo aos atores, ora se misturando a eles, as cores são marcas muito importantes para o percurso narrativo. Em A igualdade é branca, uma quase-comédia, os cenários gelados, a pele alva, a neve e a própria simbologia do casamento são explorados através de planos sempre muito carregados de uma imensidão branca.

A preocupação e o esmero com os detalhes e traços autorais na obra são tão grandes que se espera, no mínimo, que Kieslowski seja um apaixonado pela sétima arte. Engano. Kieslowski é um operário do cinema.

Logo após encerrar Rouge (A fraternidade é vermelha), o diretor cedeu uma entrevista, que viria ser incluída nos créditos do DVD, ainda no set de filmagem. O repórter lhe pergunta se ele continuaria gravando, ao que o cineasta responde não. “Não sou apaixonado por cinema. Cinema é só minha profissão”.

Em 1988, o profissional do cinema encantou-se com um projeto para a tevê em que produziria dez médias-metragens baseados nos mandamentos bíblicos. Inicialmente, o projeto seria distribuído entre uma série de outros diretores. Porém, o encanto de Kieslowski foi tamanho que pediu para que pudesse dirigir os dez filmes sozinhos, e com isso nasceu O Decálogo. É estranho assistir aos filmes imaginando que o diretor não tinha apreço por eles.

O primeiro episódio, Amar a Deus sobre todas as coisas, apresenta um diálogo entre um pai (um pesquisador) que vive sozinho com o filho (uma criança extremamente altruísta) sobre a morte:

- Por que as pessoas morrem?

- Depende... Ataques de coração, câncer... Acidentes ou de velhice...

- Quero dizer, o que é a morte?

- O coração pára de bombear o sangue... O sangue não chega ao cérebro... Tudo pára.

Assim como o pai lida com a morte como se fosse um mecanismo, Kieslowski lida com o cinema. E seus filmes têm a medida de seus propósitos. Eles têm sempre um ritmo muito próprio, que obedece a tudo com uma naturalidade providencial. E quando começamos a achar que talvez as coisas não se expliquem de forma eficiente, descobrimos que os conceitos com que ele trabalha são os próprios personagens e suas vidas.

Pudera que alguns cineastas fossem menos apaixonados pelos seus próprios filmes como Krzystof Kieslowski o é. Sobraria para nós filmes mais apaixonantes.

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Isaac Pipano
é estudante de jornalismo da Unesp. Candidato a jornalista e escritor, misto de músico frustrado e crítico de brincadeira, dono de gargalhada constante e inflamada, sãopaulino só em dias de título e não assina seus próprios perfis. Fale com ele: isaacpipano@faac.unesp.b


   
 

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