
13/09/07
Em boca fechada não entra
mosquito
Duas frases chamaram a atenção durante a última
semana. Ambas revelam o pensamento de “homens públicos”
que deveriam, antes de tudo, primar pelo respeito aos cidadãos
e pela transparência no trato com a coisa pública,
mas deixam escapar importantes traços de desrespeito
para com o povo. Eis as frases:
“Tenho certeza de que
vaiaram sem saber quem estavam vaiando”. [Ubiratan
Ângelo – Comandante-geral da Polícia
Militar do Rio de Janeiro]
A frase foi dita em plena cerimônia
de comemoração de Sete de Setembro quando
pessoas da cúpula do governo carioca, inclusive o
comandante, foram vaiadas pela população participante
da festa. Ficou evidenciado no discurso que o coronel acredita
na existência de castas sociais no país. De
um lado estão os poderosos e perspicazes homens públicos
que ignoram as manifestações de repúdio
da população e do outro está a população
acéfala que vaia apenas para seguir a tendência
de ser um povo baderneiro e inculto, que mal sabe quem são
seus governantes.
O comandante, pelas suas palavras,
acredita ser imune às críticas, e mais, não
considera a manifestação da população
contra a situação calamitosa da segurança
pública do país e, por conseqüência,
do Rio de Janeiro. Ele desvirtua a capacidade de discernimento
do povo para se eximir da responsabilidade de receber “feedback”
dos mesmos que garantem seu salário. O coronel vive
fora da realidade ou, talvez, tenha criado a sua própria
que não permite acreditar nas críticas. “Comandante
Ubiratan no país das maravilhas” não
seria nada mal.
“Em uma sessão
secreta a gente vai poder ter conversas e discursos que
não teríamos se fosse aberta” [Wellington
Salgado – Senador(PMDB-MG)]
Nesse caso a frase não
é algo tão espantoso. O senador faz referência
à sessão que discutiu a cassação
do seu colega, Renan Calheiros, também do PMDB, e
que foi realizada de forma fechada. Na minha modesta opinião,
um absurdo; entretanto o tema está previsto na Constituição
e, por isso, deve ser respeitado. Mas ao dizer que a “conversas
e discursos” diferentes acontecem em sessões
fechadas, Salgado deu um atestado de desonestidade ou no
mínimo de suspeita sobre tudo o que é dito
e feito no Senado Federal. No entanto, Salgado é
um dos fiéis escudeiros de Renan na defesa da inocência
do alagoano. Quer dizer que para as câmeras, microfones
e olhares dos jornalistas apenas as conversas permitidas
– e nada me leva a crer que não sejam encenadas
– vêm à tona, e os conchavos, cobranças
de cargos e verbas ficam para o “escurinho do cinema”?
Lamentável.
O representante do Estado de
Minas Gerais junto ao poder executivo e á Câmara
dos Deputados prefere esconder o seu voto e a sessão
para que conversas e negociatas permeiem as decisões
políticas, enquanto a transparência e a lisura
ficam em segundo plano. Nesse sentido dizer que o senador
presta um desserviço ao país não é
mera falácia. Declarar o voto após a sessão,
mesmo que isso não garanta que a palavra seja fiel
ao que foi votado, seria uma maneira de fazer as coisas
mais probas. Cabe ao povo e, nesse caso aos senadores, modificar
o Regimento interno do Senado e até mesmo a Constituição
para acabar com essa aberração.
Com apenas duas frases somos
capazes de perceber o quanto o Brasil é desigual.
Seja no aspecto econômico, social ou intelectual há
significativas diferenças entre governantes e governados,
comandantes e comandados. Nós, governados e comandados,
estamos à mercê de atitudes desaforadas e despreparadas
de uma porção de homens públicos que,
por definição, deveriam ser retos, respeitosos
e éticos, mas mostram em seus aforismos que o brasileiro
tem mesmo que “rir para não chorar”.
“Em boca fechada não entra mosquito”,
mas no caso do Brasil a boca aberta serve de alerta para
a população. Olhos e ouvidos neles.
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Guilherme
Ibraim é jornalista e desde o início
da carreira trabalhou nas assessorias de imprensa dos Correios
e Epamig (Empresa de Pesquisa Agropécuária
de Minas Gerais). Além disso participou de projetos
de jornalismo público como o Jornal da Rua. Em 2006
trabalhou como produtor de jornalismo na Rádio Inconfidência
e como repórter do site Futbrasil ( www.futbrasil.com).
Atualmente realiza coberturas e transmissões esportivas
pela Agência AMR Notícias. Fale com ele:
g.ibraim@gmail.com
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