02/09/08
Sem
título
Quisera saber
quando estivera envolvido com qualquer questão social,
com qualquer pessoa que estivesse precisando de sua ajuda.
Não se envolvia mais com ninguém, fechou-se
para todas as pessoas. Havia se magoado muito com todas
as situações tristes que vivera e com as decepções
vividas por ele. Afastou-se, assim, de tudo que poderia
lhe fazer mal. Ficou apático com o mundo, sem graça,
sem praça, sem lugar pra poder ir ou pessoas para
ver. Não tinha mais porque estar ali, nem aqui e
nem em outro lugar qualquer. Não tinha mais nada
a não ser ele mesmo.
Sua preguiça mundana era generalizada, quase uma
doença crônica, nenhuma das pessoas lhe interessava,
muitas vezes, nem seus familiares e a loucura parecia tomar-lhe
de assalto. Não se controlava mais, muito menos se
concentrava bem como antes nas coisas que sempre fez bem.
Sua vida social foi atrofiando e seus amigos pararam de
procurá-lo, afinal, não devia ser mais uma
boa companhia para ninguém.
Queria ter asas como as tatuadas em suas costas, mas eram,
infelizmente, fictícias e não poderiam fazer
com que ele alçasse vôo. Ficou de tal forma,
libertário, que não conseguia mais se prender
a nada nem a ninguém. Tinha certeza que seu amor
havia passado por ele e o abandonado.
Tinha certeza que em algum país deste mundo absurdo
estaria seu amor, que o deixou esperando por várias
vezes em estações de trem, em festas sem graça
ou em algum cinema, só que do outro lado da fileira
e, portanto, não pôde ver por causa da luz
escura da sala de projeção. Um eterno romântico
que esperava encontrar alguém que o completasse.
Mas não via ninguém que pudesse esquentar
seu coração, que o tirasse da mesmice, da
triste sina de um vivente em um mundo cinza, onde ninguém
se preocupa com o outro.
Não assistia
mais filmes românticos, tinha ficado incrédulo
e com vergonha, pois se achava sempre o último amante,
debulhava-se em lágrimas por causa da história,
principalmente quando a relação era impossível,
sentia-se em uma destas produções cinematográficas.
Foi se fechando em uma alcova cavada por si mesmo, onde
apenas o que lhe interessava era perpetrado. Assim, conseguia
manter seu humor razoavelmente suportável. Começou
a se perder em ilícitos que usava para desafogar
sua mente inconstante e desequilibrada, além de serem
seus companheiros para todas as horas. Estava preso em si
mesmo, algoz de sua própria vida social, não
procurava se socializar. Definitivamente, essa não
era sua intenção.
Incrédulo que seu envolvimento com algo social pudesse
trazer gás a seus pensamentos e sofrimentos, considerava
desnecessária sua presença em qualquer questão
relacionada a esse assunto.
A única coisa que fazia fora de sua casa era caminhar
com seu fone de ouvido pelas ruas da cidade. Aliás,
achava que assim tudo havia começado. Foi depois
que passou a usar, constantemente, aqueles fones de ouvido,
que anulou toda a realidade ao seu redor. Perdia a noção
de cidadania, não auxiliava mais ninguém em
ônibus e lugares públicos, não se importava
com o próximo e preferia essa sua realidade pessoal,
sem intromissões de outras pessoas e/ou seus comentários.
O que ficava na cabeça era apenas: por que esses
fones nunca ficam bem no ouvido? E qual é o motivo
de virem fios tão curtos, muitas vezes nem conseguimos
colocá-los no bolso da calça sem que fiquem
sendo repuxados a todo o momento que caminhamos.
Percebera que não era o único a andar com
seus fones, muitas pessoas faziam o mesmo. Pensou em como
a tecnologia que até então serviria para tornar
o mundo globalizado muito mais próximo estava de
alguma forma tornando as pessoas muito mais distantes e
atormentadas.
Já parou
pra pensar no seu dia-a-dia e nos outros ao seu redor? Qual
é a música de seu mp3?
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Urbano
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Frederico Caiafa é
Estudante de Letras - Born in 80s. Daqueles curiosos
que não desistem de conhecer algo desconhecido. Tento
transcrever em cada linha aquilo que vivo ou crio, não
tenho muita certeza do limite nesta relação,
porém, me arrisco na corda bamba sem pensar duas
vezes.
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