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Tum-tum-tum insofreável, naquela hora sua vontade era cantar sertanejo, rezar ave-marias, dar esmolas a mendigos, emprestar grana sem juros ao cunhado. A mais linda mulher que ele já havia visto estava à sua frente...

Foto:
Detalhe da Ponte Milvio - Roma
Crédito: http://www.flickr.com/photos/30208099@N00/

 

20/10/08
Sem ela, era só tristeza

— A gente já complicou demais — dizia ele, peito vibrando, mãos a tremer, sexo pura ansiedade. — Inventamos mil motivos para não ficarmos juntos e, mesmo assim, o que sobrou de amor foi de longe mais do que suficiente para não me deixar te esquecer nem por um minuto sequer após o instante em que te conheci — balbuciava sôfrego, atropelando as palavras. Agora respirando fundo para retomar o ar perdido com a tão longa frase, nem tomava conhecimento do quão piegas era não esquecer alguém “nem por um minuto”.

Mas ele já não se importava nem com a pieguice nem com a abundância de clichês que transbordava suas falas porque, no fim das contas, desde que ela o deixara ele estava (e não sem um incontido orgulho) há muito se sentindo o mais sentimental dos homens, o soberano de uma corte de lugares-comuns..

O começo foi assim: ainda quando a silhueta dela deixava de ser silhueta para seu corpo atravessar, enfim, a porta da redação, desde já ele não sabia mais o que era bossa e o que era samba; só sabia que seu coração, a partir daquele momento, começava a bater daquela forma única como só batem os corações metafóricos que encontram a razão de sua criação semântica.

Tum-tum-tum insofreável, naquela hora sua vontade era cantar sertanejo, rezar ave-marias, dar esmolas a mendigos, emprestar grana sem juros ao cunhado. A mais linda mulher que ele já havia visto estava à sua frente, sorriso aberto, cabelos ao vento, olhar intenso parado no seu; quando percebeu, tudo ao seu redor transbordava poesia, ela a perguntar: — Onde me sento? — Era sua nova colega em seu primeiro dia no jornal; paixão à primeira silhueta.

— Pediram para eu te explicar suas f-funções... — disse ele (não sem piscar o dobro do normal, prendendo com uma mão os dedos da outra, dedos que por certo fugiriam à menor distração sua). Pronto. Não havia mais como escapar. Sua vida já estava irrevogavelmente invadida pelo amor.

Mas o fim seria “assado”: término decretado e já pungindo há meses, pelos mesmos exatos meses ele se perguntava, sem resposta, qual o sentido de tudo aquilo. Não era bossa: a dor que então sentia decerto não diferia da dor que qualquer outro sentiria em seu lugar. Novidade alguma se fazia. Mas também não era o velho samba, pois se por um lado era uma típica dor de amor, por outro não era “uma”, e sim a sua dor, a dor por seu particular — e por isso tão especial — amor.

Pois cansado de buscar respostas, decidiu parar de perguntar. “A gente já complicou demais”, arriscou afirmar, pois perguntas não levam a respostas, e sim a outras perguntas. “Inventamos mil motivos para não ficarmos juntos e, mesmo assim....”, balbuciou sôfrego. “Nem por um minuto”, repetiu mentalmente, sorrindo.

Pois nem por um minuto ele esperou mais. Tomou-a pelos braços, agora firme e decidido, comprometido apenas com a verdade e com sua alma, e suspirou em seu ouvido: — Não quero mais esse negócio de você longe de mim.

Coração palpitante, ela respondeu, definitiva: — Eu também não.

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Ewerton Martis é Jornalista e escritor (pretenso),, autor de vários contos interminados, romances sem personagens, poesias e crônicas renegadas, petardos ainda à espera do tempo que é escasso e da preciosa mas furtiva inspiração para serem enfim terminados — e, quiçá, publicados. Nesse meio-tempo, escreve um blog: www.pretensoliterato.blogspot.com Fale com ele: ewerton.martins@ymail.com


   
 

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