OPPERAA
 
Baby Boom
     
 
 
     
e usando a desculpa de entrevistar as bandas para conhecê-las. É editor da Revista Ponto e Vírgula da web rádio Unesp Virtual, onde também produz o programa On the Rock!. Mais no seu blog
 

18/05/07
Repolho e o cachimbo

Desde pequena moro no mesmo bairro e sempre conheci pouco a vizinhança. Apesar de saber quem é quem, fiz raras amizades por aqui. Com a molecada da minha idade tive mais contato e, na época de escola, conheci um garoto a que todos chamavam de Repolho. Morava com os avós em uma casa simpática e estudava, diferente de mim, em um colégio particular no bairro vizinho. Levava uma vidinha normal, entre amigos, namoradas e família.

Passaram-se anos até que soube que o rapaz havia pirado. Mendigava pelas ruas a fim de sustentar o vício. Quando me abordou pedindo um trocado, notei que as pontas dos dedos denunciavam sua preferência e o sentenciavam. Morar ao lado de uma grande favela tem dessas coisas: a gente aprende a pular os corpos estendidos no chão e passa a achar normal o uso de drogas sempre por perto. A merda só conquista preocupação quando atinge alguém conhecido. Só assim a discussão do tema atravessou o asfalto e veio à tona no bairro.

A Pedreira Prado Lopes é uma das favelas mais antigas de Belo Horizonte, famosa por ter inserido o crack ao cenário do tráfico mineiro e fica bem à frente do meu bairro. Desde muito tempo percebo os cachimbos sendo acesos quando pego o atalho que passa pela avenida principal da favela para chegar em casa à noite. São luzinhas que revelam rostos jovens afundados na escuridão do vício. Reportagens já tentaram denunciar a crackolândia, mas nada foi capaz de deter a venda e o consumo da droga.

Na época da faculdade, fazia o percurso a pé e tinha que atravessar o São Cristóvão toda manhã. Mesmo estando separada da Pedreira pela Avenida Antônio Carlos, era possível notar a enorme quantidade de meninos e meninas estirados no mesmo chão que ratos e lixo também ocupavam. O efeito da droga era tão grande que, ao voltar para casa, ao meio dia e com sol a pino, eles ainda estavam lá sem ter idéia do correr das horas.

Preocupa-me pensar no futuro da região, pois não há Linha Verde, Vermelha ou Amarela que abra os olhos de governantes e cidadãos para o que se passa aqui todas as noites. Se Belo Horizonte conquista hoje a média de trinta mortos por fim de semana, isso só ganha visibilidade quando acomete jovens de regiões nobres da cidade que se envolvem com a violência por diversão e gosto pelo risco e não por se tratar da difícil realidade vivida na favela por toda uma vida. E o exercício da cidadania só começa a ser praticado quando a mãe de um deles sente que o problema pode ultrapassar as fronteiras que separam classes delimitadas por zona norte e zona sul e passa a atingir lares de "gente honesta", como se a favela não estivesse, também, repleta deles.

O tema igualdade social ainda está longe de frear o tráfico praticado por aqui, pois as pessoas desconhecem a força que possuem em mãos para combatê-lo. E mais uma noite o movimento do fechar dos olhos é feito em BH enquanto o sangue não escorre pelo lado de cá e o tiroteio continua a só ganhar destaque na televisão quando é parte integrante do eixo Rio-São Paulo.

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Cristina Mereu é formada em jornalismo pelo Uni-BH e escreve mensalmente para a coluna Trejeitos. Adora internet, cinema, fotografia, música e literatura. Seu maior sonho é ter alguém que lhe pague somente para escrever e contar histórias. E-mai: cristinamereu@gmail

Sobre a coluna Trejeitos Cada qual do seu jeito, cada um com seu trejeito. O que não muda é o amor à profissão e a vontade de registrar em palavras o que não pode ser esquecido: a capacidade de falar por aquele que cala, a crítica, o bom jornalismo, a denúncia, os vários ângulos, as diversas histórias, o lirismo.

Nesta coluna, o leitor encontra crônicas escritas sob a ótica de três diferentes estilos. Os jornalistas Ariadne Lima, Cristina Mereu e Guilherme Amorim escrevem sobre temas variados a cada semana, partilhando com o público, cada um, um jeito diferente de enxergar a vida.


   
 

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