
22/10/07
Somente trânsito
interno
Recuperando a consciência, percebo
o erro cometido: ao invés de frear, apertei o pedal
errado e acelerei batendo direto de cara no muro. Estranho
perceber que você está mais presente em minha
vida agora que não mais nos falamos do que quando
havia palavras, sorrisos e trocas. O sinal vermelho que
impedia a sua chegada até mim acabou possibilitando
a sua permanência constante. Agora debilitada, sua
presença tornou-se maior em meus pensamentos, em
meus desejos e em minhas aflições.
Busco
a fórmula para mantê-lo distante de mim, mas
acabo encontrando uma maneira eficaz de assegurar que me
siga em tempo integral. Confundo as marchas, troco os pedais,
erro os sinais e sempre percorro o seu caminho sem perceber.
Enxergo o sinal vermelho, amarelo e verde ao mesmo tempo.
Faço confusão, ultrapasso pela direita e acelero
quando quero frear. E freio quando quero acelerar.
Não
consigo parar, não respeito a regulamentação,
viro na contramão, ignoro advertências, recebo
multas para chegar à via contrária a que eu
queria estar. Sem saber aonde vou, dou seta para um lado
e viro para o outro sem ao menos reduzir a marcha. Percebo
que escureceu e, ao tentar ligar os faróis, descubro
o meu estado de pisca-alerta; sempre atenta somente aos
seus sinais.
Toda confusão
é advertência da paixão na rota de fuga
da estrada do meu coração. Todas as músicas,
sons e luzes me confundem. Já não tenho a
mesma visibilidade de antes. Troco os pés pelas mãos
e invado a pista. O vejo no horizonte, tento frear, mas
é inevitável, mais uma vez, bato direto de
cara no muro.
Leia
também:
10/09/07
-
O fim que antecede
o início
22/08/07
- Das coisas que
você enxergou em mim
30/07/07
- Repolho e o
cachimbo
09/07/07
- Sobre sapos
e formigas
18/06/07
- Nós estamos
descontroladas
28/05/07
- Nada
me importa
07/05/07
- O último dia
16/04/07
- Última gaveta
05/03/07
- A velha e a moça
____________________________________________________
Cristina Mereu
é formada em jornalismo pelo
Uni-BH, adora internet, cinema, fotografia, música
e literatura. E escreve mensalmente para a coluna Trejeitos.
Fale com ela: cristinamereu@gmail.com
Sobre a coluna Trejeitos
Cada qual do seu jeito, cada um com seu trejeito. O que
não muda é o amor à profissão
e a vontade de registrar em palavras o que não pode
ser esquecido: a capacidade de falar por aquele que cala,
a crítica, o bom jornalismo, a denúncia, os
vários ângulos, as diversas histórias,
o lirismo.
Nesta coluna, o leitor encontra
crônicas escritas sob a ótica de três
diferentes estilos. Os jornalistas Ariadne Lima, Cristina
Mereu e Guilherme Amorim escrevem sobre temas variados a
cada semana, partilhando com o público, cada um,
um jeito diferente de enxergar a vida.
|