
22/08/07
Das
coisas que você enxergou em mim
Eu
queria não ter sido tocada por tudo isso que você
diz, mas a minha vontade é em vão. Eu sigo
seus chamados. Eu fico perdida nos seus passos. Eu me acho
nos seus espaços. Eu abro a geladeira e você
está lá. Nas fotos, o seu sorriso. Na memória,
o seu jeito de falar. Nos escritos, a poesia do meu olhar.
Eu percebi que o fato de não lhe escrever não
lhe afasta dos meus pensamentos. Descobri que o que você
despertou em mim não se abafa tão fácil
e é inútil tentar não enxergar o seu
sorriso, lembrar sua voz, sentir seu toque.
Eu
vejo o seu rosto em todos os corpos. Eu lhe vejo pela cidade
que não é sua. O que não vivemos ganha
cores, movimentos, enredo e trilha sonora. Ganha vida própria
e essa vida não tem limites. Passo horas em uma realidade
que nunca existiu, sinto falta do que não vivemos
juntos e vontade de viver o que não nos foi permitido.
Eu quero lhe escrever, mas não sei o que dizer. Eu
quero lhe ver, mas não tenho um porquê. Eu
quero mudar minha vida e estar junto a você por pequenos
momentos que tragam algum sentido a esse querer.
Que
se dane a paz e a tranqüilidade que você tanto
insiste em me devolver. Eu gosto mesmo é do turbilhão
que você trouxe à minha vida em questionamentos
e dúvidas sobre tudo aquilo que sempre foi tão
certo pra mim, que me fizeram enxergar o mundo que nunca
vi e a ter vontades que nunca me permiti. Eu já me
apeguei e não consigo ser indiferente à sua
busca. Eu não consigo mais dormir, eu penso em todas
as possibilidades, eu penso no futuro e em um passado diferente
do que foi. Eu lhe busco e me encontro.
Quero
mesmo é que você volte e desfaça o que
já arrumei e me cobre atitudes adultas como encarar
os fatos de frente e respeitar os meus desejos. Quero que
me diga quando vem e que não aceita não me
rever. E não haverá Pessoa, Almodóvar
ou Neruda que sacie o que ainda temos a viver.
Quero
a permissão para reencontrar a sua risada, ouvir
sua voz e rever seus olhos sobre mim enxergando tudo aquilo
que ninguém mais é capaz de ver. Quero o seu
carinho, o seu beijo, o seu cheiro e quero mais ainda a
sua visão de mundo. Eu quero acreditar que sou aquilo
que você vê em mim e ser feliz assim. Mas tudo
que me resta fazer é guardar o que sinto e esperar
por um pretexto que me permita dizer aquilo que eu ainda
não soube entender.
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Cristina Mereu
é formada em jornalismo pelo
Uni-BH, adora internet, cinema, fotografia, música
e literatura. E escreve mensalmente para a coluna Trejeitos.
E-mai: cristinamereu@gmail.com
Sobre a coluna Trejeitos
Cada qual do seu jeito, cada um com seu trejeito. O que
não muda é o amor à profissão
e a vontade de registrar em palavras o que não pode
ser esquecido: a capacidade de falar por aquele que cala,
a crítica, o bom jornalismo, a denúncia, os
vários ângulos, as diversas histórias,
o lirismo.
Nesta coluna, o leitor encontra
crônicas escritas sob a ótica de três
diferentes estilos. Os jornalistas Ariadne Lima, Cristina
Mereu e Guilherme Amorim escrevem sobre temas variados a
cada semana, partilhando com o público, cada um,
um jeito diferente de enxergar a vida.
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