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Terça-feira - 22/05//07
Vamos falar de sexo 2

Sexo dá muito que falar. Conforme dito no artigo anterior, sexo gera discursos, promove saberes e práticas, sejam elas de especialistas, moralistas e ainda no senso-comum. Trata-se de uma brilhante invenção humana, no sentido de que a sexualidade bruta, animal, tal como ela nos é dada pela natureza necessitou de passar, no lado dos humanos, por transformações moldadas pela cultura. Trata-se de uma invenção porque se o sexo é primeiramente um dado da natureza, biologicamente determinado, com suas estruturas gonadais, genitais e cromossômicas, ele é, a partir disso, um conjunto de intervenções que são feitas nos corpos e na subjetividade, no decorrer de séculos e século. Desse modo, a necessidade da cultura impôs ao homem a necessidade de recuar diante de seus instintos, de abrir mão de sua natureza e inaugurar o sexo a partir de uma outra ordem, aquela da sexualidade.

É interessante observar como o sexo gera saberes e dá o que falar. A título de exemplo, um certo Thomas Laqueur, professor de medicina social norte-americano lançou um interessante Inventando o sexo: corpo e gênero dos gregos a Freud, pela editora Relume-Dumará. O autor parte do pressuposto de que o sexo é uma invenção, tal como vários teóricos o pensam. O interessante é a inspiração foucaultiana que o autor possui, uma vez que Realiza uma rigorosa pesquisa em torno dos discursos sobre o corpo, a reprodução, a fisiologia e as relações entre os sexos. Nesse sentido, ele aproveita sua formação médica e realiza um estudo sobre a reprodução, o sexo e a sexualidade desde os gregos até Freud e busca demonstrar como o sexo se insere em uma perspectiva discursiva.

Trata-se de um ensaio interessante, que, no entanto, preocupa-se principalmente em demonstrar como durante muito tempo houve uma insistência em torno de um sexo único: o masculino.

É sabido que desde o desde o século XVIII, de modo geral, havia uma visão dominante de que há dois sexos estáveis, incomensuráveis e opostos, e que a vida política, econômica e cultural dos homens e das mulheres, seus papéis no gênero, são de certa forma baseados nesses pontos e a biologia passa a ser o fundamento epistemológico de uma série de práticas médicas e psicológicas que eram utilizadas para domar os corpos e sedimentar práticas de segregação. No entanto, períodos anteriores ao iluminismo também diziam disso, de uma posição social assumida em função do sexo: “Ser homem ou mulher era manter uma posição social, um lugar na sociedade, assumir um papel cultural, não ser organicamente um ou outro de dois sexos incomensuráveis. Em outras palavras, o sexo antes do século XVII era ainda uma categoria sociológica e não ontológica”, afirma Laqueuer.

O que nos permite dizer, com tais observações, é que o sexo constitui-se como alguma coisa que dava o que falar porque havia lugares que uma dada sociedade queria estipular para homens e mulheres, estritamente delimitadas e estáveis e, para tanto, necessitou lançar mão de saberes hegemônicos, como a medicina e a religião, por exemplo, para fazer valer uma concepção de mundo.

É claro que juntamente com os conhecimentos produzidos houve a necessidade de se instalar uma política que criasse novas formas de localizar as pessoas dentro de certas realidades sociais e implica assim em práticas de poder que pudessem garantir certo funcionamento social mas que, necessariamente, passava pelos corpos.

O que podemos com tais idéias é sustentar que o sexo dá o que falar porque ele é uma instância fundamental no ser humano e é mesmo uma condição fundante daquilo que se chama sexualidade. A nosso ver, pensar em sexo é pensá-lo de modo é contextual. Embora universais “psíquicos” sejam encontrados em torno do sexo, uma vez que o mesmo está no inconsciente, é oportuno acrescentar que o corpo privado, incluso, estável, que parece existir na base das noções modernas de diferença sexual, é também produto de momentos específicos, históricos e culturais. Ele também, como os sexos opostos, entra e sai de foco, conforme nos ajuda pensar Laqueuer.

Se, desse modo, o que produz o sexo insere-se em uma ordem discursiva – mas não nos esqueçamos dos “universais psíquicos” – é preciso falar de sexo: falar para diminuir a diferença, falar para tratar da angústia, falar para fazer valer a diferença. Falar para marcar espaços, falar para fazer existir um modo mais digno de existe o sexo e os efeitos que ele produz no humano.


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Cássio Miranda é psicanalista, doutorando em Letras pela UFMG e escreve todas as terças. E-mail: cassioedu@oi.com.br

 

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