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A negação dos fatores que circunscrevem a questão do aborto, seus aspectos políticos e sociais, justifica comodamente a criminalização deste por parte do Estado
 

07/08/07
Pró-vida ou pró-escolha? Quem vai carregar o fardo?

A discussão sobre a legalização do aborto no Brasil, retorna de tempos em tempos, causando uma reviravolta nos ânimos - maior do que qualquer outra, como as futebolísticas ou as sensacionalistas – das pessoas, mesmo sem trazer uma reflexão adequada e isenta por parte da sociedade e das esferas profissionais diretamente ligadas ao tema.

Somente no Brasil, o aborto espontâneo ou provocado está entre as principais causas de morte de mulheres gestantes. Uma em cada três mulheres gestantes que abortam morre no Brasil, sendo que 27% dessas mortes se dão no estado de São Paulo. Segundo a Rede Feminista de Saúde, uma importante questão que precisa ser considerada na análise desta situação é a criminalização, pois na legislação do país o aborto induzido é considerado crime quando não se trata de risco de vida para a mulher ou de gravidez resultante de estupro.

Além de ser a causa provável de muitos óbitos, a clandestinidade dificulta desde o diagnóstico no atendimento médico até o registro adequado do aborto induzido, piorando a já precária qualidade com que freqüentemente esse atestado é preenchido. No atestado de óbito, o simples registro da ocorrência de um aborto induzido, sem justificativa legal, pode caracterizar uma denúncia e ter implicações judiciais para o profissional, que muitas vezes acaba por preferir a omissão.

Os países da América Latina e do Caribe estão entre os que possuem as legislações mais restritivas com relação ao aborto. Embora alguns apresentem alguma flexibilidade em suas leis, permitindo o aborto em situações como risco para a vida da mulher, estupro e outras, somente em Cuba, Barbados, Porto Rico e, mais recentemente, na Guiana o aborto pode ser realizado a pedido da mulher, sem que seja considerado um crime.

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS, 1998), em todos os demais países da América Latina, as mulheres ainda enfrentam legislações extremamente punitivas, que colocam na ilegalidade o aborto voluntário. Não se trata, portanto, apenas da oferta ou da qualidade da assistência, mas da criminalização, que pesa sobre a decisão das mulheres diante da interrupção de uma gravidez.

Nesses países, as leis restringem o aborto quando se trata de evitar uma gravidez indesejada, inoportuna ou mesmo arriscada para a saúde das mulheres. No entanto, sabe-se que o acesso a recursos de contracepção, como serviços e insumos educativos e de saúde, é limitado e as situações de violência sexual intra e extra-domiciliar são freqüentes.

Sabe-se que a descriminalização do aborto e a sua prática como direito da mulher, confrontam-se diretamente com valores e dogmas postos acima do dever e compromisso do Estado com o indivíduo - e suas justificativas - e do individuo com a responsabilidade sobre o seu próprio corpo. Omite-se também que, socialmente, o aborto está estreitamente ligado ao contexto econômico e social de quando e onde é praticado.

A negação dos fatores que circunscrevem a questão do aborto, seus aspectos políticos e sociais, justifica comodamente a criminalização deste por parte do Estado, que se isenta de responsabilidades e fecha os olhos para o modo como o aborto se insere num quadro no qual convivem e interagem miséria e riqueza, indigência e desperdício, dependência e dominação. Mas, o aborto representa um ato político, de uma condição específica, que deve ser pensado politicamente sem o respaldo de uma moral dominante instituída com base nos interesses religiosos ou de determinados grupos.

Um outro lado dos debates sobre o aborto é o que traz os embargos das questões religiosas, que no Brasil são apoiados pelas igrejas cristãs. Todavia, sabe-se que não existe consenso na afirmação de que a igreja sempre foi contrária ao aborto, visto que até então ela não se definira sobre a questão no momento em que a ciência se indagou sobre o inicio a vida humana: seria imediatamente após a concepção ou após a fecundação do óvulo? Ou haveria, conforme pensava Aristóteles, um intervalo (de 40 ou 80 dias) entre a concepção e a animação do feto? A hesitação da ciência, bem compreensível, dada a falta de meios de pesquisa, fez com que vários teólogos católicos julgassem, dos modos mais variados, a eliminação do feto antes do 400° dia (no caso dos indivíduos masculinos) ou antes do 809° dia (no caso dos indivíduos femininos).

De tal modo, devemos nos questionar em relação as nossas posições quando nos afirmamos contrários ao direito (que é político) de abortar e ao aborto como condição de uma sociedade instituída na diferença de regras e posição de grupos que defendem uma moral para todas as situações - como é o caso da igreja, que se complica historicamente em suas afirmações.

O Aborto não pode ser deixado de lado como questão de menor importância, e não seria se afetasse fatalmente uma parcela maior da população das classes mais altas, visto que estas têm acesso a clínicas especializadas no próprio país ou no exterior, preservando sua integridade e saúde.

Se nossas afirmações se baseiam em uma moral cristã, que não condiz com a realidade imediata de um país com educação precária, desigualdade social e desinformação (sim, desinformação, talvez não sua, mas de milhares de mulheres que vivem em condições sub-humanas no país), essa moral deve ser posta em questão, partindo de sua origem até seu discurso. Se o Estado proíbe e não dá condições adequadas (acesso à informação e a um serviço público de saúde decente) para os seus membros, deve ser questionado no que diz respeito ao seu papel e sua função de resguardador dessas benesses.
Seria ético partir de um princípio democrático para afirmar o direito de escolha e de responsabilidade sobre o corpo da mulher por ela mesma e pelo próprio Estado, não deixando que costumes duvidosos e contraditórios continuem dando as diretrizes para a criminalização e demais riscos daquelas que anseiam apenas tomar o controle de suas próprias vidas.

Abaixo segue um quadro de argumentos que podem nortear uma discussão superficial sobre aborto e a questão Pró-escolha e Pró-vida.

Pró-vida
1. A vida começa quando o óvulo e o espermatozóide se unem. Acabar com a vida a partir daí equivale a matar uma pessoa.
2. OK, óvulo e espermatozóide já estão vivos, mas um novo ser humano se origina quando os gametas unem seus DNAs.
3. A união do óvulo e do espermatozóide dá origem a um código genético no mundo.
4. Um óvulo fertilizado é virtualmente um ser humano. A natureza o equipou para chegar a idade adulta, basta deixa-lo crescer.
5. A lei brasileira considera o aborto um crime passível de prisão.
6. Aborto contraria a natureza.
7. Aborto contraria a natureza humana.
8. Aborto não é técnica contraceptiva. Para isso as mulheres dispõe de vários métodos anticoncepcionais, como pílulas, camisinhas, diafragmas, DIUs e cirurgias.
9. Aborto não pode ser usado como forma de resolver problemas sociais, como o da criança abandonada.
10. A indústria farmacêutica incentiva o aborto porque precisa de tecidos fetais para experiências científicas.
11. Depois do nascimento, a mãe desenvolve naturalmente um amor pela criança, mesmo que a gravidez tenha sido indesejada.
12. Pregar a descriminalização do aborto pela impossibilidade de fazer valer a lei é como sugerir a legalização do roubo e do homicídio, cuja ocorrência também fugiu do controle do Brasil.
13. Estudos mostram que, em cada país, a lei segue a opinião da população: Nos países onde a população repudia o aborto, ele é mais controlado; onde a população o aceita ele é mais liberado.
14. O embrião concebido em um estupro é inocente e não pode ser punido. O estado deve assumir a custódia da criança.
15. O feto e a mãe são seres humanos e têm o mesmo direito à vida.
16. Os corpos do feto e da mulher têm seus próprios direitos.
17. Aborto é pecado.
18. A legalização aumentará o número de abortos praticados.

Pró-escolha
1. A vida não começa na concepção. O óvulo e o espermatozóide já são vivos. A vida é uma evolução das coisas vivas.
2. A clonagem permite criar um novo ser a partir de um fio de cabelo. Fios de cabelo serão considerados pessoas agora?
3. o DNA pode ser inédito, mas não é único. Até o 15° dia de gestação, o embrião pode gerar gêmeos. Em breve, será possível gerar um novo ser a partir de um óvulo não-fertilizado, o que ocorre em sapos normalmente. O óvulo deverá ser preservado?
4. O óvulo fertilizado é muito instável para receber o status de pessoa: menos de um terço deles gera uma criança.
5. A lei brasileira não diz nada sobre a destruição de embriões obtidos por fertilização in vitro, que são iguais aos demais.
6. Sob estresse, muitas espécies abortam espontaneamente. As humanas perderam parte da capacidade de responder biologicamente ao ambiente e precisam de uma opção.
7. O aborto é praticado por vários povos indígenas sul-americanos, por aborígenes na Oceania e na África, entre outros.
8. A maioria do mundo é pobre e não tem acesso à informação ou aos contraceptivos. No Brasil, 60% das mulheres acham que a pílula anticoncepcional tem efeitos colaterais graves, quando chegam a ter acesso com as devidas informações.
9. Estudos norte-americanos associam a liberação do aborto, em 1973, com a queda de criminalidade em 1990 nos EUA, quando as crianças indesejadas completariam 17 anos.
10. Alguns avanços médicos que permitem a algumas crianças chegarem a idade adulta devem-se a estudos com fetos.
11. Mulheres que abortam podem ter a auto-estima maior do que as que levaram uma gravidez indesejada até o fim.
12. È impossível evitar que as mulheres recorram ao aborto quando não desejam procriar. A legalização, assim, evitaria que 1.500 mulheres morressem todo ano ao abortar, só no Brasil.
13. A política influencia a opinião sobre o aborto e não o contrário. Na Espanha, as taxas de reprovação ao aborto caíram depois que a legislação foi afrouxada, em 1985.
14. O estado já provou ser incapaz de tutelar crianças. E obrigar uma mãe a gerar o fruto de uma violência penaliza a vítima.
15. O feto é um ser humano em potencial. A mãe é um ser definido e produtivo e relacionado com a sociedade.
16. A mulher tem pleno direito sobre seu corpo.
17. Não há consenso entre as religiões sobre a prática do aborto. Isso depende da crença de cada um.
18. Nos EUA, os abortos subiram após a legalização, mas vêm caindo desde então.

Saiba mais
www.aborto.com.br/religiao/index.htm
www.redesaude.org.br/
www.prossiga.br/bvmulher/cedim/
www.opas.org.br/

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Carlos Alberto está se graduando em História, é chefe de cozinha e músico de araque. Especialista em filosofia de buteco, estratégias sustentáveis de sobrevivência na cozinha e soluções subversivas para superar rotinas exaustivas de trabalho.
Fale com ele: veganito126@gmail.com



   
 

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