
16/08/07
Estou segura na Zona de Risco de
Baku
Esta semana ocorreu um fato
comigo e com uma amiga daqui, brasileira também,
digno de entrar nesse texto. Nós duas fomos convidadas
por uma jornalista da BBC Brasil para falar como nos sentimos
morando numa “zona de risco”. Ignorei, pois
não quero me expor mais do que ja estou fazendo.
Entretanto, na minha cabeça a expressão “zona
de risco” não parou de latejar.
Meu marido, no dia seguinte,
depois de comentar com ele, me lembrou bem: “Zona
de risco é passar na frente do Morro do Alemão,
na favela da Rocinha”.
Vamos recrutar a historia para nos lembrar do que é
considerado “zonas de riscos” num país
onde desde 1994 não tem problemas relacionados com
as guerras. O Azerbaijão perdeu o território
no início da década de 90 após uma
guerra com a Armênia que, segundo estimativas, custou
a vida de 25.000 pessoas de ambos os lados e gerou 1 milhão
de refugiados azerbaijanos. O conflito remonta a 1988, quando
a população armênia que habitava a região
azerbaijana do Nagorno-Karabakh exigiu das autoridades soviéticas
sua incorporação à vizinha Armênia.
Em 2 de setembro de 1991, o
exclave proclamou sua independência do Azerbaijão
e, com ajuda militar da Armênia, sustentou uma guerra
de três anos que terminou com vitória dos separatistas.
As tropas armênias ocuparam todo o exclave e outros
sete distritos (Agdam, Cabrayil, Füzuli, Kalbacar,
Laçin, Zangilan e Qubadli), que formaram uma 'faixa
de segurança' em um terço do território
azerbaijano. Em 1994, foi acertado um cessar-fogo que continou
sem resolver o conflito até hoje. Desde então,
as negociações sobre o Nagorno-Karabakh e
os territórios azerbaijanos ocupados estão
praticamente em ponto morto.
Isso poderia me preocupar,
mas para ser bem sincera, não me incomoda nem um
pouco porque aqui me sinto segura e livre para ir e vir.
Desde que cheguei aqui, meu primeiro contato foi com as
cidades do interior. As pessoas eram totalmente diferentes
das que hoje convivo aqui em Baki. Os habitantes das cidades
menores são extremamente simples, vivem como se estivessem
em outro mundo, longe da globalizacao e da indústria
de consumo que falamos na semana passada. Imagine-se vivendo
em plena decada de 50, foi assim que me senti quando morei
na cidade de Imishili, que respira muita segurança
e hospitalidades das pessoas acolhedoras e risonhas. Apesar
dos duros marcos históricos que têm sofrido,
este povo é apresenta um talento nobre: o de saber
encarar os maus momentos, com um impressionante otimismo.
Convivi com o simples, com pessoas que dão valor
a um “bom dia” ou um “bom apetite”.
Éramos novidade em Imishili; tratados como reis onde
quer que colocassemos nossos pés.
Apesar da sua amabilidade e simpatia, talvez influenciados
pelo clima e as transformações políticas,
os azeris são reservados, não contam facilmente
a sua vida, e adoram fazer perguntas de um modo correto,
com uma hábil mudança de conversação.
Também têm fama de serem teimosos e, é
melhor não discutir com eles. Os jovens têm
um grande sentido de humor e é fácil relacionamento.
Aqui é a vez da moçada na faixa etária
dos 15 anos tomar conta do pais, já que ocupam a
metade da população.
A difícil situação econômica
que atravessa tem levado algumas pessoas daqui ao desespero
mais absoluto. O álcool, para uma parte, tem sido
a única resposta aos problemas. Mas há coisas
singulares, como por exemplos ver a presenças de
idosos e jovens nas praças das cidades jogando xadrez
ou dominó. E onde está a “Zona de Risco”?
Aí no Brasil você deixaria seu carro dormir
fora da garagem com a garantia de encontrá-lo pela
manhã? Aqui é comum ver carros luxuosos ao
lado dos mais simples parados em calçadas a noite
toda. Não é costume o uso das garagens.
No trânsito só me incomoda as buzinas, que
são usadas constantemente. Em Baku, o medo constante
de assaltos ou seqüestros esta distante da nossa realidade.
Pelo menos até agora a segurança não
nos abandonou. Mas é claro, há lugares, ainda
que em números irrisórios, onde já
encontramos uma caracteristica de um mundo mais globalizado
e emergente, que se vendem ou roubam.
Eu saí de um país maravilhoso, no qual não
há disputa de terra com nenhum outro país,
no qual não está dentro de uma “zona
de risco”. Mas eu vejo o Brasil daqui. Não
preciso ficar citando atrocidades brasileiras, vocês
mesmos as conhecem. Aqui minha bolsa está comigo,
minha corrente continua no meu pescoço e meu dinheiro
na minha carteira. Já ao descer no Brasil, não
sei se poderia garantir a mesma sensação.
Apesar da BBC Brasil categorizar Baku como um estado onde
se corre perigo pela disputa de terra, eu sinto que a paz
e tranqüilidade desses fabulosos azerinos.
Leia
também
09/08
- Direto do Azerbaijão. Conhece?
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Aline
Orlando Ramim, é paulista, casada, brasileira,
e nao desiste disto. Sonhadora, vive atualmente em Baku,
logo ali no Azerbaijão, na região da antiga
União Soviética onde está conhecendo
e vivendo coisas que jamais imaginaria. Aline é curiosa
ao extremo, mas não é egoísta, por
isso compartilha suas curiosidades todas as quintas-feiras
aqui.
Fale com ela: alineorlando@hotmail.com
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